Uma instituição antiga, muito conservadora,
envolvida em algumas polêmicas e que não acompanha as mudanças do mundo na
mesma velocidade em que elas acontecem. De quem estamos falando? Da Igreja
Católica? Não. Da família tradicional? Não. Da classe política? Não. Da sua
velha tia do interior? Não. É da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas
(AMPAS), mais conhecida por ser a instituição que todos os anos escolhe os
vencedores do Oscar.
Muito conservadora, a Academia raramente
reconhece interpretações em filmes de comédia, ou mesmo grandes performances de
comediantes em filmes dramáticos. Peter Sellers, que já foi chamado de “o maior
comediante britânico depois de Chaplin”, foi injustiçado três vezes pela
Academia, tanto na comédia quanto no drama.
Peter Sellers não apenas criava com perfeição
personagens muito diferentes entre si: ele criava com perfeição personagens
muito diferentes em um mesmo filme. Em seu mais conhecido esforço, “Doutor
Fantástico / Doctor Strangelove or How I Stopped Worrying and Learned to Love
the Bomb” (1964), do diretor Stanley Kubrick, Sellers interpreta três
personagens: o cientista maluco que dá nome ao filme, o capitão Lionel Mandrake
e o presidente Muffley.
Em outro filme igualmente satírico e hilário,
porém pouco lembrado, Sellers tem também três papéis. O filme é “O Rato que
Ruge / The Mouse that Roared” (1959), em que ele interpreta o soldado Tully, o
primeiro-ministro Rupert e a grã-duquesa (!!!) Gloriana XII. Se interpretações
cômicas já são pouco reconhecidas, imagine uma interpretação cômica E
travestida... Apesar de ser um dos melhores momentos de Peter Sellers e de
tratar com muito humor a paranoia das armas nucleares, “O Rato que Ruge”
continua pouco conhecido.
No mesmo ano de “O Rato que Ruge”, Sellers foi
indicado ao Oscar na categoria de curta-metragem. “The Running Jumping and
Standing Still Film” surgiu como uma diversão pessoal de Sellers com sua câmera
de 16mm, e foi filmado em Londres em dois dias com um orçamento de 70 libras. O
curta-metragem ganhou um prêmio no festival de San Francisco, conquistou os
Beatles, mas perdeu o Oscar para o filme francês “Histoire d’um Poisson rouge /
The Golden Fish”, dirigido por Jacques Cousteau (sim, o mergulhador).
A segunda indicação, agora como ator, foi
exatamente por “Doutor Fantástico / Doctor Strangelove” (1964). Na ocasião o
vencedor foi Rex Harrison por “Minha Bela Dama / My Fair Lady”.
A última chance de Peter Sellers ganhar o Oscar
foi em 1980, com um papel desafiador e redentor (literalmente). Como o
jardineiro Chance em “Muito Além do Jardim / Being There” (1979), Peter provou
que era tão genial no drama quanto na comédia. Chance era simplório, conhecia o
mundo através apenas da televisão, mas possuía sensibilidade para palpitar
sobre o governo, o funcionamento do mundo e também para destruir sem querer o
cinismo que o cercava. O vencedor da noite foi Dustin Hoffman, por “Kramer vs
Kramer”, filme que levou, aliás, cinco estatuetas. O colega de elenco de Peter,
Melvyn Douglas, ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante.
Peter Sellers seria um forte candidato a um Oscar
Honorário se não tivesse morrido repentinamente em 1980. Mesmo assim, ao longo
da carreira, Peter colecionou outros prêmios, como um BAFTA por “It’s All Right
Jack” (1959) e um Globo de Ouro por “Being There”. Mais do que isso, ele criou
um adorável, incomparável e inimitável detetive do cinema: o Inspetor Clouseau.
Seu método de composição dos personagens envolvia dedicação, exercícios vocais
e inclusive distanciamento da realidade e “ficar no personagem” mesmo longe das
câmeras – em suma, um Daniel Day-Lewis da comédia. E é por isso que Peter
Sellers merecia, sem dúvida, o reconhecimento da Academia.
This is my contribution to the Oscar Snubs Blogathon,
hosted by Constance and Diana Metzinger at Silver Scenes and Quiggy of The Midnite Drive-In.