François Truffaut, war movies and me
François Truffaut é um dos deuses do
cinema. Além de ser um grande diretor, roteirista e por vezes ator, ele amava o
cinema acima de todas as coisas. Ele era um de nós, cinéfilos. Mas isso não
significa que ele estava sempre correto em suas opiniões sobre o cinema. Há
algum tempo eu li algo que Truffaut disse e discordei dele. Truffaut disse que
não existe um filme completamente antiguerra porque mesmo os filmes antiguerra acabam
glorificando a guerra.
François Truffaut is one of the cinema gods.
Besides being a great director, screenwriter and sometimes actor, he loved
cinema above all else. He was one of us, film people. But it doesn’t mean he
was always right in his opinions about film. A while ago I read something
Truffaut said and I strongly disagreed. Truffaut said that there can’t be a
completely anti-war movie because even anti-war movies end up glorifying war.
Eu encontrei esta declaração enquanto
pesquisava para uma apresentação. Eu passei 2019 e boa parte de 2018 fazendo
esta pesquisa. No final, escolhi 34 filmes, feitos entre 1917 e 2017 – este intervalo
de 100 anos foi coincidência – sobre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais.
I came across this declaration when I was doing
research for a presentation. I spent 2019 and a good chunk of 2018 doing this
research. In the end, I chose 34 films, made between 1917 and 2017 – this
100-year period was a coincidence – about World War I and World War II.
Minha intenção era analisar o
discurso nestes filmes, e como ele mudou com o passar do tempo. No final, eu
descobri que, durante as guerras, os filmes tinham um tom bem patriótico, mas
depois ele mudava. Com “Eu Acuso!” (1919) de Abel Gance, os filmes e a
sociedade em geral começaram a ver a Primeira Guerra Mundial como uma guerra na
qual não valeu a pena lutar – e que moldou a Geração Perdida. Entretanto, por
causa dos horrores dos campos de concentração, a Segunda Guerra Mundial sempre
foi retratada no cinema como uma guerra do bem contra o mal, com os bons sendo
parte da Geração Grandiosa.
My intention was to analyze the discourse in those
films, and how it changed over time. In the end, I found out that, during the
wars, the films had a very patriotic tone, but afterwards it changed. With Abel
Gance’s “J’Accuse!” (1919), films and society in general started seeing World
War I as a war that was not worth fighting – and one that shaped the Lost
Generation. However, due to the horrors of concentration camps, World War II
was always portrayed in film as a war of good versus evil, with the good ones
being part of the Greatest Generation.
Me at the presentation |
Isso significa que a maioria dos
filmes sobre a Primeira Guerra Mundial é de filmes antiguerra, enquanto filmes
sobre a Segunda Guerra Mundial são a favor da guerra. No artigo, Truffaut
menciona “Glória Feita de Sangue” (1957), de Kubrick, como um filme antiguerra
que na verdade glorifica a guerra. Eu não concordo muito com isso, mas há um
filme que é completamente antiguerra e contesta a teoria de Truffaut: “Nada de
Novo no Front” (1930).
This means that most films about WWI are anti-war
films, while WWII films are pro-war. In the article, Truffaut mentions
Kubrick’s “Paths of Glory” (1957) as an anti-war film that actually glorifies
war. I don’t really agree with that, but there is one film that is completely
anti-war and disproves Truffaut’s theory: “All Quiet on the Western Front”
(1930).
“Nada de Novo no Front” é um filme de
1930 da Universal Pictures dirigido por Lewis Milestone. Ele é baseado no
romance homônimo de Erich Maria Remarque, publicado em 1928. Ele conta a
história do jovem alemão Paul Bäumer (interpretado por Lew Ayres) e seus
colegas de classe que se alistam no exército após um inflamado discurso
patriótico feito por um professor. Eles aprenderão que a guerra é bem diferente
da descrição do professor: menos emocionante e glamourosa.
“All Quiet on the Western Front” is a 1930
Universal Pictures movie directed by Lewis Milestone. It is based on the novel
of the same name by Erich Maria Remarque, published in 1928. It follows the
young German Paul Bäumer (played by Lew Ayres) and his fellow classmates who
enlist in the German Army after their teacher makes an intense patriotic
speech. They all will learn that war isn’t that exciting or glamorous as the
teacher had painted it.
Para mim, há duas sequências
fundamentais que mostram a desilusão destes jovens e também que a guerra não
merecia o esforço. A primeira é quando o Cabo Himmelstoss (John Wray) – o homem
abusivo que treinou os jovens antes de eles partirem para o campo de batalha –
chega ao front e, vendo a guerra pela primeira vez, se mostra um covarde.
Himmelstoss só era valente perto de jovens imaturos. Fato curioso: Himmelstoss significa "céu em queda" em alemão.
For me, there are two key sequences that show the
disillusionment of those youngsters, also showing that the war was not worth
fighting. The first is when Corporal Himmelstoss (John Wray) – the abusive man
who trained the boys before they went to the front – arrives in the front and,
seeing war for the first time, acts with cowardice. Himmelstoss was, after all,
only a big bully. Curious fact: Himmelstoss means "falling sky" in German.
A segunda sequência envolve Paul
voltando para casa, de folga. Quando ele chega à sua cidade natal, ele percebe
que ninguém lá é capaz de imaginar os horrores da guerra, e eles inclusive
acham que a Alemanha está a um passo da vitória. Pior ainda: quando ele visita
sua velha escola, ele vê o professor Kantorek (Arnold Lucy) repetindo o mesmo
discurso patriótico glorioso para alunos muito mais jovens que Paul. Revoltado,
Paul conta a eles a verdade sobre a guerra, e como o professor não sabe do que
está falando porque nunca esteve no front. Paul é então chamado de covarde
pelos jovens estudantes, em transe com o discurso patriótico.
The second sequence involves Paul coming back home
for a while. When he reaches his hometown, he realizes that nobody there
imagines the horrors of war, and they all actually think that Germany is almost
winning the war. Even worse: when he visits his old school, he finds Professor
Kantorek (Arnold Lucy) repeating the same glorious patriotic speech to students
much younger than Paul. Revolted, Paul tells them the truth about war, and how
the professor can’t know them because he had never been to the front. Paul is then
called a coward by the young students entranced by the patriotic speech.
“Nada de Novo no Front” era tão
pacifista em sua mensagem que foi banido na Alemanha Nazista, na Itália
fascista, na Áustria e até mesmo na França. Estes países só puderam ver a
obra-prima de 1930 após a Segunda Guerra Mundial.
“All Quiet on the Western Front” had such a strong
pacifist message that it was banned from Nazi Germany, fascist Italy, Austria
and even France. Those countries could only see the 1930 masterpiece after
World War II.
Além disso, a história foi tão
profunda que fez o ator Lew Ayres se tornar pacifista. Isso lhe custou muito:
ele se opunha à Segunda Guerra Mundial e se alistou no exército apenas para
servir como ajudante médico. Depois de alguma confusão, ele finalmente seguiu
no exército no posto desejado.
Moreover, the story was so appealing that it turned
actor Lew Ayres into a lifelong pacifist. This cost a lot to him: he was a
conscientious objector to the Second World War and enlisted in the army only to
serve as medical aid. A little kerfuffle followed, until he was granted his
wish.
Eu não consegui encontrar nada sobre
o que Truffaut achou de “Nada de Novo no Front” – e sua opinião seria
bem-vinda, porque o filme só estreou na França em 1963, quando Truffaut já era
crítico de cinema. De qualquer forma, eu posso dizer uma coisa: por ter os
vencedores da guerra contando uma história empática sobre os perdedores, “Nada
de Novo no Front” humaniza ambos os lados do conflito e mostra que a guerra é
inútil porque somos todos iguais. E eu sinto muito, monsieur Truffaut, mas este
filme cria este discurso antiguerra da mais perfeita e inquestionável maneira
que eu já vi no cinema.
I couldn’t find anything about what Truffaut
thought of “All Quiet on the Western Front” – and his thoughts would be
welcome, because the film was only allowed to be shown in France in 1963, when
Truffaut was already a film critic. Anyway, I can say one thing: by letting the
winners of the war tell an empathetic story about the losers, “All Quiet on the
Western Front” humanizes both sides of the conflict and shows that war is
useless because we’re all equal. And I’m sorry, monsieur Truffaut, but this
film does this anti-war speech in the most perfect, unquestionable way I’ve
ever seen on a screen.
I dunno. How do you make an anti-war movie without showing the realities of war? It’s tricky. Truffaut doesn’t necessarily sound like he’s condemning violence in movies, based on this snippet. Was this part of a wider discussion?
ReplyDeleteIt’s been awhile since I saw PATHS OF GLORY (you might want to make the correction to that title in your post), but criticism of the French military and of war in general aren’t mutually exclusive. I think they can both be part of the same conversation.
Also, there’s violence and there’s violence. I would argue the violence in PATHS or, to pick a recent example, 1917 (fantastic movie; you must see it) is not the same as that in a SAW flick. Either way, the violence should serve a purpose, but when it’s there for the sake of having it in there, that’s when the problems arise.
And yes, ALL QUIET is an exquisite film.