A
melhor semana do ano, na minha humilde opinião, acabou de acabar.
Esta semana diz respeito ao Festival de Cinema Mudo de Pordenone, um
evento que sempre agrada aos amantes de cinema mudo como esta que vos
escreve. Depois de uma edição completamente online em 2020, o
festival voltou a ter exibições presenciais de filmes no norte da
Itália, mas manteve uma versão online para nós, pobres almas que
não pudemos comparecer – eu fui mentora do Collegium este ano
porque fui membro do Collegium ano passado, mas não pude ir ao
evento presencial porque não tomei as duas doses da vacina. Aqui
estão minhas impressões sobre a programação online.
The best week of the year, in my humble opinion, is over. This week comprises the Pordenone Silent Film Festival, an event that never fails to appeal to silent film lovers like this girl writing here. Following an all-online edition in 2020, the festival went back to in-person screenings in the Italian north but kept an online version for us poor souls who couldn’t attend the event – I was a Collegium mentor this year because I was part of the Collegium last year, but couldn’t attend the in-person event as I’m not fully vaccinated. So here you have my impressions of the online progamme.
No ano passado encontrei um tema comum a todos os filmes: contraste. Em contraste, neste ano não encontrei um tema comum, mas dois dos filmes se aproximam na maneira como lidaram com – ou melhor, zombaram da – moralidade. Tanto em “Phil-for-Short” (1919) quanto no filme alemão “Moral” (1928) há defensores da moral querendo censurar os protagonistas: no primeiro filme, o guardião de Damophilia (Evelyn Greeley) quer que ela pare de se vestir como um menino, enquanto no segundo filme a artista Ninon D’Hauteville é vítima de um grupo de censores. Ambos os filmes foram muito bons, e tornados ainda melhores pelo acompanhamento musical.
Last year I found a common theme to all screenings: contrast. In contrast, this year I couldn’t find a common theme to all movies, but a couple of them were similar in the way they talked about – or rather mocked – morality. In both “Phil-for-Short” (1919) and in the German film “Moral” (1928) there are morality defenders wanting to censor the leads: in the earlier movie, Damophilia’s (Evelyn Greeley) guardian wants her to stop dressing as a boy, while in the later movie the artist Ninon D’Hauteville is the victim of a group of censors. Both film were very good, enhanced by great musical accompaniments.
"Phil-for-Short" (1919) |
"Moral" (1928) |
O filme de abertura da versão online do festival foi “The Joker” (1928), uma produção pan-europeia filmada em diversos países, inclusive na França durante o Carnaval de Nice. Trata-se de uma história de chantagem e enganação. O filme de encerramento foi “Maciste no Inferno” (1926) – certa feita mencionado por Federico Fellini como sendo o filme que o fez querer ser cineasta – uma história colossal sobre amor e poder estrelando Bartolomeo Pagano. “Maciste no Inferno” foi particularmente importante porque sua restauração foi possível com o uso de material oriundo da nossa Cinemateca Brasileira, atualmente fechada e ameaçada.
The opening film of the online version of the festival was “The Joker” (1928), a pan-European production shot in several countries, including in France during the Carnaval in Nice. It’s a story about blackmail and deception. The closing movie was “Maciste in Hell” (1926) – once mentioned by Federico Fellini as the film that made him want to become a filmmaker – a colossal tale of love and power starring Bartolomeo Pagano. “Maciste in Hell” was particularly important because its restoration was made possible with material from our Brazilian Cinematheque, that is currently closed and threatened.
"The Joker" (1928) |
"Maciste in Hell" (1926) |
Nesta
Giornate assisti ao meu primeiro filme mudo australiano: “The Man
from Kangaroo” (1920). É um faroeste decente estrelado por Snowy
Baker – uma mistura de Tom Mix, Douglas Fairbanks e Johnny
Weissmuller. Também assisti ao meu primeiro filme mudo sul-coreano,
que não era mudo: “A Public Prosecutor and a Teacher” foi feito
em 1948, logo após o final da Segunda Guerra Mundial e da ocupação
japonesa, quando o país sofreu uma escassez de recursos para fazer
filmes sonoros. Este bom melodrama tinha um Beyoncé
byeonsa, ou seja, um narrador que interpretava a ação e a maior
parte dos diálogos.
In
this
Giornate I watched my first Australian silent film: “The Man from
Kangaroo” (1920). It’s a decent western starring Snowy Baker –
a mix of Tom Mix, Douglas Fairbanks and Johnny Weissmuller. I also
watched my first South Korean silent film, which wasn’t silent at
all: “A Public Prosecutor and a Teacher” was made in 1948, right
after World War II and the Japanese occupation had ended and the
country suffered from a shortage of material to make sound films.
This nice melodrama
had a Beyoncé
byeonsa, that is, a narrator that acted out the action and most of
the dialog.
"The Man from Kangaroo" (1920) |
"A Public Prosecutor and a Teacher" (1948) |
Meu filme favorito da Giornate online foi mais uma vez o filme da terça à noite: “Fool’s Paradise” (1921), de Cecil B. DeMille, é tudo que um fã de cinema mudo pode querer. Ele tem literalmente de tudo no enredo: um veterano da Primeira Guerra Mundial ferido, uma cidade na fronteira cheia de poços de petróleo e homens mal-encarados, um cigarro explosivo, um cego, sotaques franceses, amor verdadeiro, um incêndio, uma viagem ao Sião e um sacrifício a crocodilos num templo. Poll Patchouli, interpretada pela grande Dorothy Dalton, rapidamente se tornou uma das minhas personagens mais queridas do cinema mudo.
My favorite film from the online Giornate was once again shown in a Tuesday night: Cecil B. DeMille’s “Fool’s Paradise” (1921) is everything a silent movie fan could ask for. It has literally everything in its plot: a wounded WWI veteran, a small town in the border full of oil wells and greasers, an exploding cigar, a blind man, French accents, true love, a fire, a trip to Siam and a sacrifice to crocodiles in a temple. Poll Patchouli, played by the great Dorothy Dalton, quickly became one of the silent movie characters dearest to my heart.
Esta edição também exibiu curtas-metragens. No segundo dia, cinco deles foram exibidos, quatro italianos e um francês. Eles incluíam um vislumbre dos estúdios Ambrosio em 1913, um alerta sobre ópio, uma animação stop-motion muito criativa e uma criança que vê os sentimentos da mãe em bolhas de sabão. Mais três curtas-metragens foram exibidos no último dia, todos dos estúdios Vitagraph no Brooklyn mas com temas japoneses – e um deles provavelmente tem Florence Turner fazendo yellowface. Nestes curtas da Vitagraph, a presença de uma atriz mirim chamou a minha atenção: a de Adele De Garde. No curta italiano “Le Bolle di Sapone”, a atriz mirim Maria Bay também teve uma boa performance.
This edition also showed short movies. On the second day five of them were shown, four from Italia and one from France. These included a sneak peek at Ambrosio studios in 1913, a cautionary tale about opium, a very creative stop-motion animation and a kid envisioning his mother’s feelings in soap bubbles. Three more shorts were shown in the last day, all from Vitagraph studios in Brooklyn but all with Japanese themes – and one of them that probably has Florence Turner in yellowface. In these Vitagraph shorts, the presence of a child star called my attention: Adele De Garde. In the Italian short “Air Bubbles”, child actress Maria Bay also had a fine performance.
"Ito, the Beggar Boy" (1910) |
"Le Bolle di Sapone" (1911) |
Nós, que estávamos em casa, tivemos um bom vislumbre de toda a programação do festival presencial. Muitas mulheres ganharam destaque, em frente às câmeras – como Ellen Richter de “Moral” e as “Nasty Women” de tantas comédias – e por trás das câmeras – como as mulheres roteiristas. “An Old Fashioned Boy”, de 1920, estava entre os filmes exibidos na programação dedicada às mulheres roteiristas. É um filme muito divertido que inclusive zombou da necessidade de se fazer quarentena, o que é muito curioso quando levamos em consideração nossos tempos pandêmicos.
We, the people at home, could get a nice glimpse of all the programmes that the in-person festival had. Many women were highlighted, in front of the camera – like Ellen Richter from “Moral” and the “Nasty Women” of so many comedies – and behind the camera – like the female screenwriters. “An Old Fashioned Boy”, from 1920, was among the films in the female screenwriters programme and it was a very funny movie that even mocked the need to quarantine, which is quite curious considering our pandemic times.
Eu gostei demais da Giornate deste ano, mas senti muita falta das nossas sessões do Collegium no Zoom, que foram tão especiais e enriquecedoras ano passado. A cada ano aprendemos algumas coisas na Giornate e uma das coisas que aprendi este ano é que o ato de ir ao cinema, para ser totalmente apreciado, deve ser um evento social.
I enjoyed this year’s Giornate immensely, but I really missed our Collegium Zoom sessions that were so special and enriching last year. Every year we learn some things from the Giornate, and one of the things I learned this year is that cinemagoing, to be fully enjoyed, must be a social event.
Para informações mais detalhadas sobre os filmes da 40ª Giornate del Cinema Muto, leia os posts da minha amiga Danielle.
1 comment:
"I also watched my first South Korean silent film, which wasn’t silent at all" LOL
You know, I work for film festivals so it's always nice to discover more of them and learn from other people's experience. Really enjoyed reading your article!
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