A relação do cinema com a moda começou na década de 1920, quando pela primeira vez as moças da plateia se inspiraram nas atrizes para criarem sua forma de vestir. Desde então, foi sempre o cinema que inspirou a moda de diversas maneiras. Ou quase sempre. Numa situação inédita, em 1934, um filme retratou o mundo da moda e, apesar de não estar entre os mais memoráveis filmes da época, ainda impressiona pela modernidade do tema.
Sherwood Nash (William Powell) é um empresário falido que decide entrar no mundo da moda associando-se à estilista Lynn Mason (Bette Davis). As técnicas de Nash não são muito honestas, e incluem copiar modelos franceses ou mesmo velhas roupas que já não são mais usadas. Logo ele fica sabendo que essas práticas são comuns no mundo da moda e muitos dos empresários que o haviam acusado de falsificação acabam virando seus clientes.
Assuntos como falsificação, cópia de modelos e lançamento de tendências com materiais diferentes são assuntos fashion até hoje. Se antes as falsificações eram abomináveis, dependendo do lugar, muitas são aceitáveis por tornarem acessíveis produtos com design semelhante aos que são mostrados na passarela. Outras adaptações semelhantes trazem tendências para as mãos do povo, que dificilmente poderia comprar um original de grife. Claro, isso ainda não era pensado ou discutido na década de 1930, mas a personagem de Bette Davis já tem a semente dessa ideia em seu travesso cérebro.
Um pouco de chantagem também faz parte do show, pois Nash reconhece uma velha amiga de infância que se faz passar por duquesa (Verree Teasdale) e está de casamento marcado com um homem rico. Ameaçando contar o passado da amiga, Nash consegue que ela patrocine o desfile deles.
Uma câmera na bengala: brilhante ideia! |
Em Paris, onde se passa a maior parte da ação do filme, um criador de avestruzes incentiva Nash a comprar as penas de suas aves para usá-las nas confecções. Ele hesita, mas logo imagina que pode lançar algo completamente diferente. E você imaginava que inspirações da natureza no mundo da moda são coisa recente?
O próprio lançamento da coleção de Nash e Lynn é um espetáculo à parte, o clímax do filme que, como uma boa produção da Warner em meados da década de 1930, contou com um número elaborado pelo sempre criativo Busby Berkeley, conhecido por suas sequências de dança filmadas do alto, criando formas geométricas na tela em preto e branco nos filmes “Rua 42 / 42th Street” (1933), “Cavadoras de Ouro / Gold diggers of 1933” e “Damas” (1934). Ao som da canção “Spin a little web of dreams”, o desfile apresenta as roupas brancas enfeitadas com penas através de um charmoso balé, com a formação de diversas flores e depois de um barco, todos esses efeitos conseguidos com a bela coreografia das modelos. Bem que os desfiles de moda atuais podiam se inspirar neste filme, não?
Bette Davis, antes ainda do início de sua glória no cinema, tem pouco espaço no filme, que é quase todo do já veterano William Powell, responsável pelos momentos cômicos. Bette, aliás, ainda nem impõe a própria imagem, uma ez que, no primeiro desfile em Paris, ela aparece como um clone de Greta Garbo para Warner Brothers. No documentário biográfico “Bette Davis: um magnânimo vulcão”, de 1983, ela lembra como foi ridículo vestir-se de Garbo. Disposta a ficar feia para um bom papel, Bette só aceitou essa pitada falsa de glamour para convencer os executivos da Warner a deixarem-na fazer um filme na RKO: “Escravos do desejo / Of human bondage”, que foi seu primeiro passo para figurar entre as grandes intérpretes do cinema.
Não um dos melhores filmes de seus intérpretes, mas um espetáculo adorável, que talvez pecasse pelo excesso se tivesse sido filmado em cores. Mais que isso, um pedaço de história do cinema que estava prestes a acabar: um dos últimos filmes a serem lançados antes do Código Hays de conduta, “Modas de 1934” apresenta trocadilhos, frases de duplo sentido e muitas moças com roupas diminutas. Os figurinos foram feitos por Orry-Kelly, que, com quase 300 filmes no currículo, incluindo "Casablanca" e "Quanto mais quente melhor / Some like it hot", pelo qual ganhou o Oscar, hoje é pouco lembrado, embora seja parte importante do glamour e da magia de Hollywood.
This is my contribution to the second Fashion in Film blogathon, hosted by Angela at The Hollywood Revue.