} Crítica Retrô: Variações sobre um mesmo tema: “O Pássaro Azul” (1918, 1940 e 1976)

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Sunday, October 19, 2014

Variações sobre um mesmo tema: “O Pássaro Azul” (1918, 1940 e 1976)

Maurice Maeterlinck foi um filósofo belga. Pode parecer estranho que um filósofo tenha deixado como principal legado um conto de fadas, mas, quando conhecemos “O Pássaro Azul”, percebemos que a situação é lógica. Só um filósofo poderia criar uma obra tão poderosa e brilhante sobre o sentido da vida, e foi isto que Maurice fez em 1908, quando escreveu a peça “O Pássaro Azul”, adaptada para o cinema dois anos depois como curta-metragem, e servindo de ponto de partida para três longa-metragens aqui discutidos (e também um desenho animado de 2011). Maurice ganhou o Nobel de Literatura em 1911, e atrevo-me a dizer que talvez seu “Pássaro Azul” seja mais bonito e inspirador que “O Pequeno Príncipe”.

Maurice Maeterlink was a Belgian philosopher. It may seem odd that a philosopher left as his main legacy a fairy tale but, when we get to know “The Blue Bird”, we see that this is only logical. Only a philosopher could create such a powerful and brilliant work about the meaning of life, and it was exactly this that Maurice did in 1908, when he wrote the play “The Blue Bird”, adapted to the screen two years later as a short film. It was also the source for three feature films discussed here (and also an animated film from 2011). Maurice won the Nobel Prize of Literature in 1911, and I dare to say that maybe his “The Blue Bird” is more beautiful and inspiring than “The Little Prince”.
Durante a noite, os irmãos Tyltyl e Mytyl são acordados pela fada Berylune, que tem uma missão para eles: encontrar o raro pássaro azul da felicidade. Claro que eles não partem nesta jornada sozinhos: as almas de todas as coisas ao redor também entram na aventura! Tyltyl, que até então gozava do quem pensava que as coisas tinham alma, fica maravilhado ao descobrir a alma do Leite, do Fogo, da Água, do Ar, do Açúcar, da Luz, do Gato e do Cão. Procurando pelo pássaro, eles passam pelo Castelo da Noite, pela casa dos avós das crianças (que já estão mortos!), por um Palácio de Luxos e pela Morada do Tempo.

During the night, the siblings Tyltyl e Mytyl are waken up by the fairy Berylune, who has a mission for them: to find the rare blue bird of happiness.Of course they don't go alone: the souls of all the things laying around also go on the adventure! Tyltyl, who used to make fun of people who thought things had a soul, is marvelled to find out about the souls of Milk, Fire, Water, Air, Sugar, Light, Cat and Dog. Looking for the vird, they go through the Night Castle, their grandparents' house (even though granny and grandpa are already dead!), through a Palace of Luxury and through the House of Time.
Passei a maior parte do tempo boquiaberta vendo a versão de 1918. Meus olhos viram poucas coisas tão belas quanto este filme. Maurice Tourneur era um excelente artesão das telas e fez filmes muito bonitos visualmente, mas não seria exagero classificar este “O Pássaro Azul” (1918) como sua obra-prima. São vários os momentos em que as lágrimas poderiam rolar, e destaco aqui um: o reencontro das crianças com seus avós e com os irmãozinhos mortos (são SETE irmãozinhos mortos. Esta é a cena mais importante sobre mortalidade infantil na história do cinema).

I spent most part of the time watching the 1918 version without words to describe it. My eyes have seen few things as beautiful as this movie. Maurice Tourneur was an excellent artisan of the screen and made very beautiful movies, but it's not an exaggeration to classify “The Blue Bird” (1918) as his masterpiece. There are many moments in which tears could drop, and I highlighht one: when the children meet again their grandparents and dead siblings (there are SEVEN dead siblings. This is the most important scene about child mortality in film history).
Todos os efeitos especiais desenvolvidos de Méliès a D.W. Griffith são usados no filme, e com resultados estupendos. Tudo é crível: as roupas que voam e se ajeitam nas crianças, o jogo de luz e sombra, as mudanças de ambiente. Ajuda muito o fato de Tula Belle (intérprete de Mytyl), Lillian Cook (fada Berylune) e Gertrude McCoy (alma da Luz) serem lindas como anjos. Lillian Cook morreria logo após as filmagens, com apenas 19 anos. Quem também faleceu em 1918 foi John van der Broek, o genial cinegrafista responsável pelo visual mágico do filme (sério, ele merecia o Oscar de Melhor Fotografia!).

All the special effects developed from Méliès to D.W. Griffith are used in the film, and with stupend results. Everything is believable: the clothes that fly and fit the children, the chiaroscuro, the setting changes. It helps that Tula Belle (who plays Mytyl), Lillian Cook (fairy Berylune) and Gertrude McCoy (the sould of the Light) are as beautiful as angels. Lillian Cook would die rigt after filming ended, she was just 19. Who also died in 1918 was John van der Broek, the genius cinematographer who is responsible by the look of the film (really, he deserved the Best Cinematography Oscar!).
A versão de 1940 foi o que sobrou para Shirley Temple depois do sucesso de “O Mágico de Oz” na MGM. Este filme conta inclusive com uma sequência de passagem (abrupta, é bem verdade) das cenas em preto e branco para o Technicolor mágico. Assim, quando Mytyl (Shirley) e Tyltyl (Johnny Russel) são acordados pela fada, é como se eles entrassem em sua terra de Oz particular. Os cenários são maravilhosos e os efeitos especiais, apesar de terem envelhecido pior que os de Oz, são bem utilizados. Mas parece que os gastos foram muitos, porque tivemos um corte nas almas: aqui, os irmãos são acompanhados somente pela Luz (Helen Ericson), pelo cão Tylo (Eddie Collins) e pela gata Tylette (Gale Sondergaard). Também fica de fora a sequência no Castelo da Noite, e no lugar temos árvores iradas.

The 1940 version was what had left for Shirley Temple after “The Wizard of Oz” was a success at MGM. This film also has a transition scene (a very abrupt one) from black and white scenes to the ones in magical Technicolor. So, when Mytyl (Shirley) and Tyltyl (Johnny Russel) are awaken by the fairy, it is ifthey had entered their particular land of Oz. The sets are wonderful and the special effects, even aging worse than the ones from Oz, are well used. But it looks like the budget was huge, because we have a cut in the souls: here, the siblings have only the company of Light (Helen Ericson), the dog Tylo (Eddie Collins) and the cat Tylette (Gale Sondergaard). The Night Castle was also cut, and in its place we have angry trees.
O que mais me chamou a atenção nesta versão de 1940 é a presença da garotinha Caryll Ann Ekelund, que tenta nascer antes da hora pela terceira vez na sequência do futuro. Este foi o único filme de Caryll. Pouco depois das filmagens, ela morreu queimada em um acidente durante o Halloween.

What called the most my attention in this version is the presence of the little girl Caryll Ann Ekelund, who tries to be born before time by the third time in the future sequence. This was Caryll's only film. A little after filming wrapped, she died from burns in a Halloween accident.
Bastidores / Backstage
Em 1976, voltam as almas de todas as coisas, e com acréscimo: agora elas falam em rimas, têm efeitos sonoros e sotaque (porque alguns atores eram soviéticos). Com a volta do Palácio da Noite como cenário, temos a oportunidade de ver críticas pontuais às doenças e às guerras. Isso tudo é muito interessante, mas não chega perto do interesse despertado pelo star cast: Elizabeth Taylor (em QUATRO papéis), Jane Fonda, Ava Gardner e Robert Morley (o rei Luís XVI de “Maria Antonieta”, 1938). Katharine Hepburn e Shirley MacLaine recusaram o convite para fazer parte do elenco.

In 1976, all the souls of the things are back, and with a plus: now they talk in rhymes, have sound effects and accents (because some actors were Russian). With the comeback of the Night Castle, we have the opportunity to see some criticism to disease and wars. Everything is very interesting, but not as interesting as the all star cast: Elizabeth Taylor (in FOUR roles), Jane Fonda, Ava Gardner and Robert Morley (king Louis XVI from “Marie Antoinette”, 1938). Katharine Hepburn and Shirley MacLaine refused roles in the film.
A melhor parte da versão de 1976 sem dúvida é o ballet do pássaro azul (você não leu errado). Aliás, há bastante música nesta versão, e também um ballet performático abstrato envolvendo o Fogo e a Água. E, embora ninguém tenha morrido logo após o filme, os sets estavam cheios de problemas: George Cukor e toda a equipe foram mandados para filmar na União Soviética. Jane Fonda queria discutir o comunismo com a população local. James Coco, que interpretaria o cachorro, só comia pão e engordou tanto que o figurino não servia mais. Cukor acusou a atriz Cicely Tyson (a gata) de usar vudu para atrapalhar as filmagens.

The best part in the 1976 version is without a doubt the blue bird ballett (you didn't read it wrong). There is plenty of music in this version, and also an abstract performatic ballett with Fire and Water. And, even though nobody died right after filming ended, the sets were full of trouble: George Cukor and his crew were sent to shoot in Soviet Union. Jane Fonda wanted to discuss communism with the local population. James Coco, who would play the dog, only ate bread and got too fat for his canine outfit. Cukor accused Cicely Tyson (the cat) of using voodoo to  disturb the shooting.
Do do that voodoo that you do so well
Os filmes de 1940 e 1976 contam com uma sequência em que as árvores atacam as crianças, o que faz muito sentido, pois o pai de Tyltyl e Mytyl é lenhador. Em 1940, há um incêndio digno de Rhett e Scarlett. Ambos têm efeitos especiais um pouco datados. A versão de 1940, entretanto, conta com cenários maravilhosos, enquanto a de 1976 é mais... campestre. Com exceção de Jane Fonda que, de acordo com um usuário do IMDb, parece “Darth Vader travestido”.

The versions from 1940 and 1974 have sequences in which the trees attack the children, which makes sense, because Tyltyl's and Mytyl's dad is a lumberjack. In 1940, there is a fire that would please Rhett and Scarlett. Both have dated special effects. The 1940 version has wonderful sets, while the 1976 one is more... country-ish. Only Jane Fonda doesn't look country: according to an IMDb user, she looks like “Darth Vader in drag”.
Todas as versões de “O Pássaro Azul” foram um fracasso de bilheteria. Entretanto, todas as pessoas que viram um desses filmes quando crianças se lembram deles com carinho e nostalgia. Fica óbvio que foram produções pensadas para crianças... e também para aquele adulto especial que ainda tem uma criança dentro de si e que sabe que o mais importante na vida pode ser o mais banal.

All the versions of “The Blue Bird” were box-office failures. However, everybody who has seen one of those films as a child rememvers them with happiness and nostalgia. It is obvious that they were movies targeted to children... and also to that special adult who still has a child inside and knows that the most important in life can be the simplest thing.

P.S.: Para uma análise mais profunda e bem-escrita da versão de 1918, leia este post maravilhoso da Nitrate Diva.

P.S.: To a deeper and better-written analysis of the 1918 version, read this marvellous post from The Nitrate Diva.

This post is my contribution to the Stage to Screen blogathon, hosted by Rosie and Rachel at The Rosebud Cinema and Rachel’s Theatre Reviews.  

7 comments:

Danielle Crepaldi Carvalho said...

Ótima resenha, Lê!
Confesso que desconhecia todas as versões de "Pássaro azul" (apenas a de nome, a de Temple). Maeterlinck foi um ficcionista admirável, além de filósofo. É dele "Pélleas e Melissande", uma das peças de teatro mais lindas que já li, que depois viraria uma ópera tão bela quanto, por Debussy.
Fiquei comovida só com as fotografias da versão de 18, acompanhadas pelo seu texto. Você é uma grande garimpadora! Quero baixá-lo. Esses europeus da virado dos anos 10 para 20 são muito criativos e poéticos. Conta pra mim onde você a encontrou?

Bisous e obrigada por tantas dicas boas!
Dani

Carol Caniato said...

Gente, que dica maravilhosa! Estou estudando alguns conceitos da filosofia para o mestrado e me deixa curiosa demais saber de um história escrita por um filósofo, ainda mais que tenha virado filme! Vou procurar pra ver com certeza!
Beijos!

Iza said...

Já tinha ouvido falar do filme com a Shirley Temple.
Não sabia que era um livro. Que legal!
Beijos ♥

Unknown said...

I managed to get this translated in English via Google Translation. Beautiful analysis.
I love what you wrote about the special effects of the original 1918 film. The Scenery of the 1940 film, and about massive cast of the 1976 film. Too bad all of them flopped.
I haven't watched any version. Which version do you recommend the most?

Unknown said...

Todas as versões do pássaro azul para o cinema são simplesmente mágicas,eu assisti as versões de 1918,1940 e a de 1976 e realmente adorei todas...Parece um sonho.🌷🌷🌷🌷

Anonymous said...

A morte da Caryll Ann Ekelund foi horrivel, mas o pior de tudo foi o que a minha explicadora Cátia que fez troça desta história tão trágica

Anonymous said...

Uma senhora sádica chamada Virgínia fez "troça" da morte da Caryll Anne

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