} Crítica Retrô: Alice nas Cidades (1974)

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Friday, September 16, 2011

Alice nas Cidades (1974)

Vamos às definições: “road movie” é um filme cujo enredo se passa “na estrada” e a viagem do (s) protagonista (s) serve de metáfora para um aprendizado.  Wim Wenders é um cineasta alemão responsável por vários filmes que tratam de questões existenciais, como “Paris, Texas” (1984), pelo qual ganhou a Palma de Ouro em Cannes.

Em meados da década de 1970, ele realizou uma trilogia de “road movies” estrelados pelo ator Rüdiger Vogler. “Alice nas Cidades” é o primeiro deles. Vogler interpreta Philip Winter, um jornalista alemão sem inspiração na América. Com um punhado de fotos tiradas por ele mesmo e nenhum assunto para escrever, ele decide voltar para a Alemanha. Isso não será tão fácil como parece: um problema no sistema aeroviário impede a viagem já planejada. No aeroporto, Philip conhece Lisa e sua filha Alice (Yella Rottländer), também prestes a ir para a Alemanha. Mais por necessidade que por afinidade, eles travam amizade e dividem um quarto de hotel. Na manhã seguinte, Philip descobre que Lisa foi embora, deixando Alice sob seus cuidados. Ela promete reeencontrá-los em Amsterdã, o que não acontece, levando homem e menina a cruzarem a Europa em busca da avó de Alice.

Se nos Estados Unidos Philip sentia-se sozinho, durante a viagem ele e Alice experimentam uma curiosa solidão a dois. Sim, estão sós, pois, mesmo perseguindo um mesmo objetivo (encontrar a avó de Alice), não iniciaram essa jornada por vontade própria. Philip não se sente confortável com a companhia da criança. Talvez sinta-se tão perdido dentro do mundo adulto que mesmo sua própria infância é incapaz de voltar-lhe à mente como algo plausível e do qual ele poderia retirar alguma simpatia para com Alice. Talvez ele esteja tão descrente que precisa das fotos (de uma documentação) para provar a si mesmo o que viu da vida.

A importância da imagem para Philip é evidente. Ele tira fotos incessantemente, mesmo elas não representando a realidade, como ele conclui e confessa. O que seria, então, uma representação do mundo melhor e mais evoluída que a fotografia? O cinema. E, talvez, a televisão. Mesmo quebrando um televisor e revoltando-se com as imagens veiculadas pelas propagandas norte-americanas, mais tarde é a TV assistida pela menina que se torna símbolo do início da mudança de Philip. E Alice, por sua vez, retoma o contato com sua identidade e com o mundo através de uma foto da casa da avó.

Aos nove anos de idade, Alice parece mais madura que seu acompanhante perdido. Ela traduz o cardápio escrito em holandês, sabe se cuidar e é a causa da mudança de Philip. Séria, porém carismática, ela não se torna jamais frágil ou dramaticamente sentimental. Procurar a avó da menina é uma metáfora para Philip se procurar, ou procurar sentido em sua vida. Quando se vê responsável por uma criança, percebe finalmente que tem de assumir novas responsabiliades típicas da idade adulta. Contagiado por Alice, ele acaba mostrando que não odeia realmente a cultura norte-americana que não o inspirou. Por fim, Alice e Philip estão se divertindo, tirando fotos em uma cabine.

Quando Alice é informada de que sua avó foi localizada, assim como sua mãe, acaba também a viagem de Philip: ele se reencontrou. Não podemos deixar de nos deliciar com a jornada comparada, de maneira ao mesmo tempo óbvia, simplória e genial, de Alice e o Chapeleiro Louco (ou seria o próprio Lewis Carroll?) e imaginar que, finalmente, Philip encontrou em Alice um assunto para sua história.

"Encontrei com Alice nas Cidades a minha própria caligrafia no cinema. Muito mais tarde, tornou-se-me claro que, nestes anos que passaram, o meu trabalho oscilara entre dois pólos: os filmes a preto e branco sobre temas pessoais e os filmes a cores, adaptações de obras literárias."
Wim Wenders

5 comments:

Hugo said...

Gostos dos trabalhos de Wendes, principalmente os das décadas de setenta e oitenta, mas este filme ainda não tive oportunidade de assistir.

Considero "Asas do Desejo" sua obra máxima.

Até mais

ANTONIO NAHUD said...

Puxa, faz um tempão que vi esse filme. Lembro que gostei muito. Preciso revê-lo. Muito bacana o post. Wenders merece.

O Falcão Maltês

PapoBacana said...

parabens pelo blog ..
muito legal mesmo..
abraços..

Unknown said...

Paris, Texas e Asas do desejo eu lembro bem dele...
Mas, não conhecia Alice nas cidades.. achei interessante e já anotei aqui para ver!

;D

Anonymous said...

Gostaria de assistir a esse filme de Wenders. Vi outro 'road movie' dele - PARIS, TEXAS - e gostei, mas ASAS DO DESEJO é uma obra-prima.

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