Em 1924, John Ford já
havia feito 51 filmes como diretor, entre curtas e longas-metragens, e tinha
mais 42 créditos como ator (sob o nome Jack Ford). Foi aí que a Fox resolveu
contratá-lo para dirigir “O Cavalo de Ferro”, que seria a resposta do estúdio
para o sucesso da Paramount “Os Bandeirantes / The Covered Wagon” de 1923. Quinze
anos antes de tirar seu maior astro, John Wayne, dos filmes B, o próprio Ford
teve esta grande experiência que o colocou, definitivamente, na lista dos
grandes diretores.
David Brandon Sr (James
Gordon) é um visionário. Ele imagina que um dia as ferrovias irão ligar o país
de costa a costa, o que faz com que ele vire motivo de piada para os vizinhos.
Mas seu amigo Abe (Charles Edward Bull) concorda com ele. Determinado a ver seu
sonho virar realidade, David vai para o Oeste com seu filho pequeno, Davy
(Winston Miller). Eles estão cheios de esperança, até que uma tribo hostil os
ataca e mata David Sr. O pequeno Davy nunca mais se esquecerá do assassino, um
homem com apenas dois dedos em uma das mãos.
O ano agora é 1862. O amigo
esperançoso de David Sr é na verdade Abraham Lincoln, o presidente americano, e
quer começar a construção de duas grandes ferrovias no Oeste. Milhares de
trabalhadores se deslocam para lá, entre eles diversos chineses. Quem também
precisa se mudar é a família Marsh, incluindo Thomas (Will Walling), o vizinho
cético do começo do filme, e Miriam (Madge Bellamy), a namoradinha de infância
de Davy. O problema é que Miriam não agüentou esperar a volta de Davy e ficou
noiva do engenheiro inescrupuloso Peter Jesson (Cyril Chadwick). E Davy, onde
está? Bem, cavalgando pelas planícies, ele é atacado por alguns índios, pula de
seu cavalo e se esconde justamente na cabine do trem em que Miriam está!
Vemos aqui alguns dos
elementos que apareceriam mais tarde nos filmes de John Ford: grandes tomadas
ao ar livre (de “No tempo das diligências / Stagecoach”, 1939), lutas entre
brancos e índios (“Forte Apache”, 1948), uma boiada que deve ser transportada
(tema principal de “Rio vermelho”, 1948), a presença de figuras históricas como
Lincoln e Buffalo Bill (“A mocidade de Lincoln / Young Mr Lincoln”, 1939), a
filmagem em locação no Monument Valley (“Legião Invencível / She wore a yellow
ribbon”, 1949) e uma boa briga no saloon, presente em qualquer western que se
preze. E, é claro, uma dose impensável, mas bem-vinda, de humor.
Mas mais interessante que
observar o que já ia se delineando da persona de Ford como diretor é ver que
ele está aqui muito mais próximo de D. W. Griffith ou Cecil B. DeMille que de
si mesmo no futuro. O filme chega a ser exagerado em sua duração (mais de duas
horas), e conta uma história cheia de reviravoltas, tanto é que o espectador
distraído ou desacostumado ao grau de atenção que o cinema mudo exige pode
perder algum detalhe, como a identidade do homem de dois dedos (dica: é o homem
que sempre fica com a mão no bolso).
Griffith: You dirty newcomer! Five years ago I would be the one doing this picture!
You'll see, you are too smal for a career in the movies!
Ford: I am BIG! It's YOUR pictures that got small!
George O’Brien era um ilustre
desconhecido em 1924. Ele havia sido campeão de boxe na marinha durante a
Primeira Guerra, e depois foi extra, dublê e assistente de câmera em Hollywood.
O Davy interpretado por George é o personagem mais carismático do filme e o
homem mais bonito do Oeste. É para ele que torcemos, embora Davy esteja,
comparativamente, em poucas cenas. É a ferrovia a protagonista da história,
isso ninguém pode negar.
Quando perguntaram para
Orson Welles quais eram seus três diretores favoritos, ele respondeu: “John
Ford, John Ford e... John Ford”. Para falar a verdade, Welles viu “Stagecoach”
vezes antes de estrear na RKO com sua obra-prima “Cidadão Kane” (1941). A
estreia do pupilo Welles acabou sendo mais brilhante que a do mestre Ford, até
porque “O Cavalo de Ferro” estava longe de ser a primeira película de John
Ford, então com 31 anos. E, curiosamente, em 1941, Welles perdeu o Oscar de
Melhor Diretor exatamente para John Ford.
Talvez os westerns mudos
percam um pouco da magia do gênero: nada de sons de tiroteios, de estouros da
boiada, de trompetes anunciando a chegada da cavalaria, nem sequer o som do
apito do trem, elemento tão importante neste filme (seria fantástico se ele terminasse
com um apito autêntico). Apesar de ser uma obra ainda crua do diretor, ela nos
dá o raro privilégio de ver o talento de John Ford em formação.
P.S.: Jean Arthur aparece como extra, sendo creditada no IMDb como "repórter". Provavelmente ela está na cena com o presidente Lincoln ou na cena final. Se vocÊ souber exatamente onde Jean aparece, escreva nos comentários! :)
5 comments:
I'm glad that you pointed out how themes established here would show up again throughout his career. I never thought about Ford's pre-Stagecoach career as a filmmaker until now.
A long movie, but engrossing and wonderful to see those Fordian touches outside of our usual context. Well done.
Olá Lê!
Fico admirada de vc resgatar em seu blog esse filmes clássicos que merecem ser vistos!
Então...eu ando bem desiludida com a blogsfera...tempos atrás era tão legal, mas agora tantas pessoas abandonaram. Eu tento voltar mas esses últimos meses eu estou focando apenas em cosplays e eventos porque está rolando grupos e estou tentando melhorar nisso. Mas não quero abandonar o blog, quem sabe um dia eles voltem á ativa. Porque senão, a internet ficará sem fontes de informação,.. limitadas á redes sociais dcomo facebook.
Na postagem mais recente que fiz, tem o link para a fanfic que estou escrevendo acerca do personagem que fiz cosplay, se quiser dá uma olhada e diga o que acha ^^.
bjs
Great post on a wonderful (if a little over long for my liking!) movie. It's so interesting to see how Ford developed so many of the themes you highlighted during the rest of his career. Thanks Le!
Filme histórico com muita história, se é que você me entende. John Ford é lendário...
Grande post, Lê!
Beijões e desculpe pelo sumiço!
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