} Crítica Retrô: July 2022

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Saturday, July 9, 2022

Cantando na Chuva: a cobertura de um clássico na imprensa brasileira

 

Singin’ in the Rain: the coverage of a classic in the Brazilian press

“Cantando na Chuva” estreou em 27 de março de 1952 nos EUA. O filme estreou no Brasil, segundo o IMDb, três meses depois, em 30 de junho de 1952. Setenta anos atrás, um filme que iria entrar para a história estreava, mas ele não foi considerado um clássico logo de cara. Foi um sucesso de bilheteria, claro, mas não ganhou nenhum Oscar e não animou os críticos - estivessem estes críticos nos EUA ou no Brasil.

“Singin’ in the Rain” had its premiere on March 27th, 1952 in the USA. It premiered in Brazil, according to IMDb, three months later, on June 30th, 1952. Seventy years ago, a film that would enter history premiered, but it wasn’t considered a classic right after its premiere. It was a box-office success, of course, but won no Oscars and didn’t excite critics - no matter if these critics were in the USA or Brazil.

O burburinho sobre “Cantando na Chuva” começou antes mesmo de o filme estrear. Num anúncio publicado no começo de 1952 na revista Cine Reporter, o filme foi citado, junto com “Scaramouche” e “Ivanhoé” como atrações vindouras da MGM que em breve chegariam aos cinemas. O texto do anúncio dizia, ao lado da figura de um leão: “Exibir MGM significa festa o ano inteiro!” Também antes da estreia, a mesma revista credita Gene Kelly como diretor de “Cantando na Chuva” e diz que a película é “considerada uma das melhores revistas musicais dos últimos tempos.”

The talk about “Singin’ in the Rain” started even before the film premiered. In an ad published early in 1952 in the magazine Cine Reporter, the movie was cited, together with “Scaramouche” and “Ivanhoe” as coming attractions from MGM that would reach the theaters soon. The text of the ad said, next to the figure of a lion: “Exhibiting MGM means partying during the whole year!” Also before the premiere, the same magazine credits Gene Kelly as director of “Singin’ in the Rain” and says it is “considered one of the best musicals of recent times.”

“Cantando na Chuva” foi exibido com “Scaramouche” e “Ivanhoé” num evento especial no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, ocorrido no cinema Metro-Copacabana. Os três filmes ficaram conhecidos como “a trinca de ouro” e, depois desta estreia, já eram elogiados. O Cine Reporter chamou “Cantando na Chuva” de obra-prima, enquanto um repórter da Revista da Semana disse ser “nosso musical favorito”. A revista de cinema A Scena Muda elogiou o filme como símbolo do “amadurecimento do musical como gênero, englobando inclusive seriedade de intenções.” 

“Singin’ in the Rain” was exhibited with “Scaramouche” and “Ivanhoe” in a special event in Rio de Janeiro, then Brazil’s capital, hosted at the Metro-Copacabana movie theater. The three movies were known as “the golden trio” and, after this premiere, were already celebrated. Cine Reporter called “Singin’ in the Rain” a masterpiece, while a reporter from the Revista da Semana said it was “our favorite musical”. The film magazine A Scena Muda praised the movie as being a symbol of the “maturing of the musical as a gender, encompassing even serious intentions.”

O jornalista José Amádio, escrevendo a coluna Cine-Revista para a revista O Cruzeiro, chama o filme de “um leve e agradável Technicolor”, “agradável como uma tarde de primavera, no campo” e elogia as performances de Jean Hagen, que rouba todas as cenas em que está, e Donald O’Connor - primeiro chamando O’Connor de “quase sempre insípido”. Debbie Reynolds é “tão agradável aos olhos como um arco-íris” e Gene Kelly não é “tão bom cantor como bailarino”.

The journalist José Amádio, writing the Cine-Revista column at the magazine O Cruzeiro, calls the movie “a light and pleasant Technicolor”, “pleasant like a spring afternoon in the country” and praises the performances by Jean Hagen, who steals all the scenes she’s in, and Donald O’Connor - first calling O’Connor “almost always tasteless”. Debbie Reynolds is “as pleasant to the eyes as a rainbow” and Gene Kelly is not “as good as a singer as he is as a dancer”.

Além de ser elogiado pela imprensa, outros já estavam percebendo a qualidade de “Cantando na Chuva”. A Scena Muda publica que a The British Film Academy escolheu o musical como um dos melhores filmes do ano de 1953, junto com “Milagre em Milão”, “Rashomon”, “Carrie”, “Uma Aventura na África” e “Los Olvidados”.

Besides being praised by the press, others were already perceiving the high quality of “Singin’ in the Rain”. A Scena Muda publishes that The British Film Academy chose the musical as one of the best movies of the year 1952, together with “Miracle in Milan”, “Rashomon”, “Carrie”, “The African Queen” and “Los Olvidados”.

Em 1953, um artigo intitulado “A Garota que Venceu o Leão” foi publicado na revista Cinelândia sobre Debbie Reynolds. O artigo diz: “Ao entrar para o cinema, Debbie não sabia representar, mas aprendeu. Não sabia dançar, mas tomou algumas lições e tentou. Quem viu “Cantando na Chuva” pôde constatar o que dizemos.” A revista A Scena Muda foi mais bondosa com Debbie, dizendo que “em “Singin’ in the Rain”, Debbie saiu-se vitoriosa em uma verdadeira prova de fogo, cantando, dançando e representando como uma veterana “vedette” da tela.” E o artigo termina assim: “Não existe pessoa alguma que após assistir “Cantando na Chuva” não se tenha tornado fã de Debbie Reynolds.”

In 1953, an article called “The Girl who Won Over the Lion” was published in the Cinelândia magazine about Debbie Reynolds. It said: “When she got into the movie business, Debbie didn’t know how to act, but she learned. She didn’t know how to dance, but took a few lessons and tried. Whoever saw “Singin’ in the Rain” could see what we mean.” The magazine A Scena Muda was kinder to Debbie, saying that “in “Singin’ in the Rain”, Debbie won a hard battle, singing, dancing and acting like a true veteran of the musical movies”. And the article ends with this: “There is no person who, after watching “Singin’ in the Rain”, did not become a fan of Debbie Reynolds.”

Em 1974, um longo artigo sobre Gene Kelly na revista O Cruzeiro diz que, com “Cantando na Chuva”, ele se tornou um dos reis do musical. Naquela época, aos 62 anos, Kelly estava no Brasil para promover “Era uma Vez em Hollywood” e deu uma entrevista para a revista, na qual diz que seu próximo projeto era uma refilmagem musical de “A Mulher do Dia” (1942), algo que não se concretizou.

In 1974, a long article about Gene Kelly in the magazine O Cruzeiro says that, with “Singin’ in the Rain”, he became one of the kings of musical movies. At that time, at age 62, Kelly was in Brazil promoting “That’s Entertainment!” and gave an interview to the magazine, saying that his next project would be a musical remake of “Woman of the Year” (1942), something that was never made.

Mas nenhum jornalista brasileiro escreveu mais sobre “Cantando na Chuva” do que Ruy Castro. Na verdade, Gene Kelly e Cyd Charisse estão na capa de seu livro “Um Filme é para Sempre”. Neste livro, há uma seção inteira - Toró Mágico - dedicada a “Cantando na Chuva”, com quatro artigos sobre o filme. Nestes artigos, escritos entre 1991 e 2002, Ruy fala sobre a recepção morna do filme em 1952 e os papéis de Charisse, Kelly e Stanley Donen na feitura deste grande filme.

But no Brazilian journalist wrote more about “Singin’ in the Rain” than Ruy Castro. In fact, Gene Kelly and Cyd Charisse are on the cover of his book “Um Filme é para Sempre” (“A Film is Forever”). In this book, there is a whole section - Toró Mágico, or Magical Pouring - dedicated to “Singin’ in the Rain”, with four articles about the film. In these articles, published between 1991 and 2002, Ruy talks about the tepid reception of the film in 1952 and the roles of Charisse, Kelly and Stanley Donen in shaping this great film.

O tempo fez bem a “Cantando na Chuva”. O filme foi revisto, reconsiderado, serviu de assunto para reflexão através dos anos. Hoje, quase todos concordam que é o melhor musical já feito - não importa se é nosso favorito, é o melhor e ponto. Afinal, não há teste melhor para um filme que o teste do tempo.

Time was good to “Singin’ in the Rain”. It was rewatched, reconsidered, it served as food for thought through the years. Today, almost everybody agrees that it is the best movie musical ever made - no matter if it isn’t our favorite, it is definitely the best. After all, there is no better test for a movie than the test of time.

This is my contribution to the Singin’ in the Rain blogathon, hosted by The Classic Movie Muse. What a glorious feeling!

Sunday, July 3, 2022

A Mulher do Doutor Phibes / Doctor Phibes’ Wife

 

Dr Phibes é um homem que preza a família. E, como ele não tem filhos, sua família se resume à sua devotada esposa, Victoria Regina Phibes. Mas nós nunca a conhecemos com vida nos filmes estrelando Dr Phibes. No entanto, é ela o catalisador para a trama do primeiro filme desta, podemos dizer, “pequena franquia”: é a morte dela que faz com que Anton Phibes busque vingança.

Dr Phibes is a family-oriented man. And, since he has no children, his whole family is comprised of his devoted wife, Victoria Regina Phibes. But we never met her alive in the movies starring Dr Phibes. However, she is the catalyst for the plot of the first movie of this, could we say, “little franchise”: it’s her death that makes Anton Phibes seek revenge.

O Abominável Dr Phibes” (1971) começa com uma figura sinistra, coberta por uma capa, tocando um órgão – quase como o “Fantasma da Ópera” de Lon Chaney. A figura é o Dr Anton Phibes (Vincent Price), um homem que já matou alguns médicos. Às vezes ele usa animais, como ratos e morcegos e outras pragas, e enquanto ele comete o crime sua assistente Vulnavia (Virrginia North) toca violino. Mas ele cometeu um terrível erro no último assassinato, pois deixou cair um colar na cena do crime.

The Abominable Dr Phibes” (1971) starts with a sinister, cloaked figure playing an organ – almost like Lon Chaney’s “Phantom of the Opera”. The figure is Dr Anton Phibes (Vincent Price), a man that has been going around killing physicians. Sometimes he uses animals, like rats and bats and other plagues, and while he commits the crime, his assistant Vulnavia (Virginia North) plays the violin nearby. But he made a huge mistake in his latest killing, as he left his necklace in the crime scene.

Todas as vítimas têm algo em comum, além da profissão: todos foram, em um momento ou outro de suas vidas, próximos do Dr Vesalius (Joseph Cotten). E todos eles se juntaram para tratar a esposa do Dr Phibes, que acabou morrendo na mesa de cirurgia. Não vai demorar até que o inspetor Harry Trout (Peter Jeffrey) resolva este quebra-cabeça.

All the victims have one thing in common, besides the profession: they all have been, in some point of their lives, associated with Dr Vesalius (Joseph Cotten). And they all came together to take care of Dr Phibes’ wife, who ended up dying during surgery. It won’t be long until Inspector Harry Trout (Peter Jeffrey) puts all the pieces together.

O final de “O Abominável Dr Phibes” – completo com uma versão de “Over the Rainbow” – não é a última vez em que veremos o assassino. “A Volta do Dr Phibes” (1972) começa três anos após os eventos do primeiro filme, quando o Dr Phibes volta à vida graças à luz da lua e sai de sua casa em busca de um papiro que pode levá-lo a desvendar os segredos da ressurreição e da vida eterna.

The ending of “The Abominable Dr Phibes” – complete with a rendition of “Over the Rainbow”- is not the last time we see Phibes. “Dr Phibes Rises Again” (1972) begins three years after the events of the first film, when Dr Phibes is brought back to life by the moonlight and comes out of his house looking for a papyrus that can lead him to the secrets of resurrection and eternal life.

O grande problema agora é que o papiro está nas mãos de Darrus Biederbeck (Robert Quarry), um arqueólogo que promete dar ao joalheiro Harry Ambrose (Hugh Griffith, que interpretou um rabino no primeiro filme) todo o ouro que ele encontrar no local que o papiro indicar. Quando o Dr Phibes volta a matar para roubar o papiro, o inspetor Harry Trout volta à cena.

The main issue now is that the papyrus is currently with Darrus Biederbeck (Robert Quarry), an archaeologist who promises to give jewel maker Harry Ambrose (Hugh Griffith, who played the role of a Rabbi in the first movie) all the gold he might find in the place the papyrus indicates. After Dr Phibes kills once again to steal the papyrus, Inspector Harry Trout gets back to the scene.

Novamente em posse do papiro, Dr Phibes sobe num navio junto com uma nova Vulnavia (Valli Kemp), Biederbeck, Ambrose e a namorada de Biederbeck, Diana (Fiona Lewis). O destino deles é o Egito, onde procurarão o rio da vida.

Once again with the papyrus, Dr Phibes boards a ship together with a new Vulnavia (Valli Kemp), Biederbeck, Ambrose and Biederbeck’s girlfriend Diana (Fiona Lewis). Their destination is Egypt, to find the river of life.

A atriz por trás do retrato de Victoria é Caroline Munro, mais conhecida atualmente por ter interpretado Naomi em “007: o Espião que me Amava” (1977). Pelas datas, Victoria morreu aos 28 anos, enquanto Caroline tinha apenas 22 quando o primeiro filme estreou. Ela não foi creditada em nenhum dos dois filmes porque, segundo o IMDb, ela tinha um contrato com a Hammer Films, estúdio onde fez seus maiores sucessos.

The actress behind Victoria’s picture is Caroline Munro, better known today for playing Naomi in “007: The Spy who Loved Me” (1977). By the dates, Victoria died at 28, while Caroline was only 22 when the first film was released. She wasn’t credited in either of the films because, per IMDb, she was under contract to Hammer Films, studio where she made her biggest successes. 

Esta não é a primeira vez em que um filme com Vincent Price tem um retrato de mulher em destaque: outra vez em que isso acontece é, obviamente, com o retrato de Laura Hunt em “Laura” (1944). Neste filme noir, o detetive Mark McPherson (Dana Andrews) fica obcecado pelo retrato de Laura, mostrando a mesma afeição que levaria o Dr Phibes a matar muitas pessoas após fazer esta promessa ao retrato da falecida esposa.

This is not the first time a Vincent Price movie has a picture of a woman playing a major role: another time it happens is, of course, with Laura Hunt’s picture in “Laura” (1944). In this film noir, detective Mark McPherson (Dana Andrews) becomes infatuated with Laura’s picture, showing the same affection that would lead Dr Phibes to kill many people after promising to do so to his late wife’s picture.

Os filmes são ambientados na década de 1920 – algo que não podemos perceber pelas roupas, mas sim pelos carros e alguns objetos como telefones. Um terceiro filme com Dr Phibes foi planejado, mas nunca realizado, pois Vincent Price tinha outros projetos e o estúdio que fez os dois filmes, American International Pictures, também mudou de estilo em suas produções.

The films are set in the 1920s – something we can’t say by looking at the clothes, but by looking at the cars and some objects like the phones. A third movie featuring Dr Phibes was planned, but never made, as Vincent Price had other projects and the studio that made the two movies, American International Pictures, also shifted ways with their production.

Dr Phibes é um gênio do mal. Ele conseguiu reconstruir seu rosto desfigurado e achou um jeito de continuar falando mesmo depois de um terrível acidente. Ele viajou quilômetros e fez muitas vítimas, em dois filmes de horror que também têm humor. E no final torcemos por ele, afinal, tudo o que Dr Phibes fez foi por amor.

Dr Phibes is an evil mastermind. He managed to reconstruct his disfigured face and find a way to keep on speaking even after a terrible incident. He traveled many miles and made many victims, in two horror films that are also pretty humorous. And in the end we root for him, after all, everything Dr Phibes did, he did for love.

This is my contribution to the Other Than a Bond Girl blogathon, hosted by Gill and Gabriela at Realweegiemidget Reviews and Pale Writer.

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