} Crítica Retrô: 2024

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Saturday, December 21, 2024

Blade Runner (1982)

 No último ano e meio, fiz um curso online sobre cinema de ficção científica, focando em como o cinema previu a Inteligência Artificial e o Metaverso décadas antes de estas coisas existirem. Por causa desta aula decidi finalmente assistir a “Blade Runner - Caçador de Androides”, mesmo tendo recebido um imenso spoiler durante a aula. Como acredito que o mais importante não é o final, mas a jornada, decidi seguir com meu plano de ver o filme. Aqui estão minhas opiniões:

 

For the past year and a half, I’ve been taking an online course about sci-fi cinema, focusing on how movies predicted Artificial Intelligence and the Metaverse decades before those things appeared. Because of this class I decided to finally watch “Blade Runner”, even though in the class I received a massive spoiler. Believing that the most important isn’t the outcome, but the journey, I decided to nevertheless watch the movie. Here are my thoughts:




O ano é 2019. Há carros voadores em Los Angeles e o ser humano está colonizando outros planetas. Uma companhia vem criando Replicantes, androides que são similares às pessoas na aparência, força e inteligência, para serem usados como escravos. Depois de uma rebelião, fica acertado que Replicantes podem ficar só em outros planetas. Se um Replicante é encontrado na Terra, é eliminado por um caçador de androides.


The year is 2019. There are flying cars in Los Angeles and mankind is colonizing other planets. A company has created Replicants, androids that are similar to people in appearance, strength and intelligence, to be used as slaves. After a rebellion, Replicants need to stay only on other planets. If a Replicant is found on Earth, it is destroyed by the Blade Runners.



Um dos caçadores de androides é Deckard (Harrison Ford, apenas cinco anos depois de “Star Wars”), que descobre que memórias estão sendo implantadas nos Replicantes para deixá-los ainda mais parecidos com humanos. A missão dele é destruir quatro Replicantes - sem criar laços com eles, o que se mostra impossível.


Such a Blade Runner is Deckard (Harrison Ford, only five years after “Star Wars”), who finds out that memories are being implanted in the Replicants to make them even closer to humans. His mission is to destroy four Replicants - without creating bonds with them, which proves impossible.


Filmes ambientados no futuro costumam ser demasiado otimistas quanto às coisas que alcançaremos até que o futuro se torne presente. Filmes e séries de TV de ficção científica como “Blade Runner” previram que teríamos carros voadores no século XXI, assim como prédios ultra-altos, chamadas de vídeo e equipamentos que respondem a comandos de voz - pelo menos nestes eles acertaram! Outra coisa que o filme acertou foi no multiculturalismo: há pessoas de todo lugar e etnia na Los Angeles de 2019. Eles não previram, entretanto, a xenofobia que infelizmente viria junto.


Films set in the future usually are over-optimistic with all the things that will be accomplished until the future becomes present. Sci-fi movies and TV shows like “Blade Runner” predicted that we’d have flying cars in the 21st century, as well as ultra-high buildings, video calls and equipments that answer to voice commands - at least these they got right! Another thing that the movie got right was multiculturalism: there are people from all places and ethnicities in 2019 Los Angeles. They didn’t predict, however, the xenophobia that would unfortunately come with it.



“Blade Runner” foi produzido por Run Run Shaw, que viveu até os 106 anos e em sua longuíssima vida produziu 380 filmes. O diretor Ridley Scott considerou rodar o filme em Hong Kong, onde Shaw mantinha seus negócios, mas teve de se contentar em filmar em Hollywood. O filme estourou o orçamento e o clima no set era tenso, especialmente entre Scott e o astro Harrison Ford.


“Blade Runner” was produced by Run Run Shaw, who lived to be 106 and in his long long life produced 380 films. The director Ridley Scott considered shooting the movie in Hong Kong, where Shaw had his enterprises, but had to film in Hollywood nevertheless. The movie ended up being over-budget and the mood on the set was tense, especially between Scott and the star Harrison Ford.



O roteiro é de Hampton Fancher e David Peoples, baseado no romance “Androides sonham com ovelhas elétricas?”, de Philip K. Dick, de 1968. O filme começou a ser planejado em 1975. O autor do romance aprovou e elogiou a escolha de elenco, dizendo que tanto Harrison Ford quanto Rutger Hauer eram perfeitos para os papéis. Infelizmente, Philip K. Dick nunca viu o filme completo, pois faleceu no começo de 1982, ano de estreia do filme.


The screenplay is by Hampton Fancher and David Peoples, based on the novel “Do androids dream of electric sheep?” by Philip K. Dick, from 1968. The film started being planned in 1975. The author of the novel approved and highly praised the casting, claiming that both Harrison Ford and Rutger Hauer were perfect for their roles. Unfortunately, Philip K. Dick never saw the completed film, as he died in early 1982, the year the movie was released.



“Blade Runner” inaugurou a tendência de um filme ter mais de uma versão final. Aqui há duas: uma com e outra sem narração, e os finais também diferem. Em 2007 o público viu a “versão do diretor”, vinda de um negativo que não foi apresentado ao público em 1982.


“Blade Runner” inaugurated the tendency to have more than one final version. There are two: the one with and the one without narration, and they have different endings. In 2007 the audience saw the “director’s cut”, coming from a negative that was not presented to the public back in 1982.



A música foi “composta, arranjada, executada e produzida por” Vangelis, um mestre da música eletrônica. Devemos agradecer a ele pela criação de um clima perfeito durante o assassinato de um Replicante - ou, como é dito dentro do filme, uma “aposentadoria”. Há também ótima música quando Rachael (Sean Young) desfaz seu penteado - que foi inspirado em Joan Crawford!-, antes de beijar Deckard. Surpreendentemente, a cena mais emocionante da morte de Batty (Rutger Hauer) não é acompanhada de música.


The music was “composed, arranged, performed and produced by” Vangelis, a master in electronic music. We should thank him for the moody music during the assassination of a Replicant - or, as it’s called within the film, a “retirement”. There is also great music when Rachael (Sean Young) undoes her hair - that was inspired by Joan Crawford! -, before kissing Deckard. Surprisingly, the more emotional scene of  Batty’s (Rutger Hauer) death has no soundtrack.



Fiquei surpresa ao notar que “Blade Runner” não é um filme muito longo. Com quase duas horas de projeção (118 minutos), é muito mais curto que outras ficções científicas feitas mais ou menos na mesma época, como “2001: uma Odisseia no Espaço” (149 minutos de duração), e até mesmo a sequência “Blade Runner 2049”, que tem 164 minutos de duração!


I was surprised that “Blade Runner” isn’t a very long movie. Clocking in at nearly two hours of projection (118 minutes), it’s much shorter than other sci-fi movies made around the same time, such as “2001: a Space Odyssey” (149 minutes long), and even the sequel “Blade Runner 2049”, that is 164 minutes long!



Deckard diz que Replicantes são como quaisquer outras máquinas: podem ser benéficas ou uma ameaça. O mesmo pode ser dito sobre todas as novas tecnologias, incluindo a IA e o Metaverso. Não é a tecnologia que é inerentemente boa ou ruim, é nosso uso delas. Se tivermos que tirar uma lição de “Blade Runner”, esta é uma boa.


Deckard says that Replicants are like any other machine: either a benefit or a hazard. The same can be said about all new technologies, including AI and the Metaverse. It’s not the technology that is inherently good or bad, it’s how we use them. If we have to come up with a lesson from “Blade Runner”, this is as good as any other.


Saturday, December 14, 2024

Filibus (1915)

 

Atualmente tenho 190 títulos na minha lista de filmes para assistir no IMDb e 225 filmes na lista do Letterboxd. Nunca perco uma chance de adicionar novos títulos a estas listas – mas, como você deve imaginar, eu deveria estar trabalhando para deixar estas listas menores. Eu fui ver minhas listas para escolher um filme parar assistir e escrever sobre quando a Rebecca do blog Taking Up Room anunciou o evento chamado On the Spot blogathon. E ali, on the spot, escolhi o filme italiano de 1915 “Filibus: o misterioso pirata aéreo”.

 

I currently have 190 titles on my watchlist on IMDb and 255 films on my watchlist on Letterboxd. I never waste an opportunity to add new titles to these lists – but, as you might imagine, I should be working to make the lists smaller. I jumped to the watchlists to choose a movie to write and review when Rebecca from the blog Taking Up Room announced her On the Spot blogathon. And, on the spot, I chose the 1915 Italian film“Filibus: the mysterious sky pirate”.

A questão é que Filibus não é exatamente um misterioso pirata aéreo. Desde o início sabemos que Filibus é na verdade a Baronesa Troixmonde (Valeria Creti). Um novo roubo a banco levou o detetive Hardy (Giovanni Spano) a ser contratado para descobrir quem realmente é Filibus. Mais encantada que preocupada com isso a Baronesa promete a Hardy que vai provar que ELE é Filibus.

 

The issue is that Filibus isn’t a mysterious pirate of the sky at all. Since the beginning we know that Filibus is actually Baroness Troixmonde (Valeria Creti). A new bank robbery led detective Hardy (Giovanni Spano) to be hired to find out who Filibus really is. More amused than worried with it, the Baroness promises Hardy that she will prove that HE is Filibus.

Um plano é executado: a irmã do detetive Hardy, Leonora (Cristina Ruspoli), é raptada e resgatada pelo Conde De la Brive, que é na verdade a Baronesa travestida. Isso permite que a Baronesa fique próxima de sua vítima seguinte, Leo Sandy (Filippo Vallino, provavelmente – o ator não foi totalmente identificado), um colecionador de antiguidades. E então Hardy cai em uma de suas armadilhas: ao comparar impressões digitais, ele descobre que as dele são iguais às de Filibus e passa a acreditar que está enlouquecendo.

 

A plan is executed: detective Hardy’s sister, Leonora (Cristina Ruspoli), is kidnapped and rescued by Count De la Brive, who is actually the Baroness in drag. This allows the Baroness to become close to her next victim, Leo Sandy (Filippo Vallino, probably – the actor wasn’t identified for certain), an antiques collector. And then Hardy falls on one of her traps: while comparing handprints, he finds out his matches Filibus’s and starts thinking that he is becoming insane.

“Filibus” ilustra bem as muitas oportunidades que existiam para mulheres no Primeiro Cinema. Como o meio era considerado só mais uma curiosidade, as mulheres podiam dirigir, atuar, escrever e produzir seus próprios filmes. A imagem de uma donzela em perigo amarrada aos trilhos do trem é apenas um mito: as mulheres eram ousadas e corajosas nos filmes das décadas de 1900 e 1910, incluindo seriados nos quais as estrelas dispensavam dublês. Adicionado a isso temos em “Filibus” alguns temas que eram novidade para o cinema e a sociedade, como uma heroína travestida que flerta com uma mulher apesar de também ser mulher.   

 

“Filibus” illustrates well the many opportunities that existed for women in early cinema. As the medium was considered just another curiosity, women could direct, act, write and produce their own films. The image of a damsel in distress tied to train tracks is only a myth: women were bold and courageous in films from the 1900s and 1910s, including serials in which the stars did their own stunts. Adding to this were some themes in “Filibus” that were brand new to cinema and society, such as a cross-dressing heroine who flirts with females despite being female herself.

Uma aeronave é peça fundamental na narrativa, algo que não seria possível uma década antes – na verdade, o cinema feito uma década antes era muito diferente do cinema feito em 1915! Não importa se você acredita que os irmãos Wright ou Santos Dumont inventaram o avião, você sabe que ele foi inventado na primeira década do século XX. Aeronaves não eram de interesse somente dos departamentos de guerra dos países: o cinema desde o início incluiu a novidade nas narrativas – e o próprio Santos Dumont esteve envolvido com o mundo do cinema, conforme escrevi AQUI.

 

An airship is a fundamental piece in the narrative, something that wouldn’t have been possible a decade before – in reality, film from a decade before was very distinct from what was made in 1915! No matter if you believe that the Wright brothers or Santos Dumont invented the airplane, you know that it was invented in the first decade of the 20th century. Aircrafts weren’t only of interest of the war departments in several countries: film since the beginning included the novelty in narratives – and Santos Dumont himself was linked to the movie world, as I wrote HERE.

Você não precisa ser fluente na língua para saber que Troixmonde vem do francês. É uma variação de “trois mondes”, que significa três mundos, em alusão a Filibus, a Baronesa e o Conde. Não podemos evitar torcer para Filibus, que é interpretado por Valeria Cresti, uma atriz que por décadas não recebeu crédito pela performance, até que o pessoal do Eye Filmmuseum da Holanda a reconheceu.

 

You don’t need to be fluent in the language to know that Troixmonde comes from the French. It’s a variation of “trois mondes”, that means three worlds, in an allusion of Filibus, the Baroness and the Count. We can’t avoid to root for Filibus, who is played by Valeria Cresti, an actress who wasn’t for decades given credit for the performance, until folks at the Eye Filmmuseum in the Netherlands recognized her.

“Filibus” foi produzido pela companhia Corona, que durou somente de 1914 a 1918. Foi escrito por Giovanni Bertinetti, antecipando temas do movimento Futurista e também da ficção científica, gênero no qual o autor mais tarde se especializou. A escolha por uma anti-heroína pode ter vindo de seriados da época como “Fantômas” (1913) de Feuillade e também da popularidade de Arsène Lupin. O filme termina apontando para uma possível continuação que foi impedida pela Primeira Guerra Mundial, infelizmente.

 

“Filibus” was produced by the short lived – from 1914 to 1918 – production company called Corona. It was written by Giovanni Bertinetti, anticipating themes from the Futurist movement as well as science fiction tropes, a genre the author would specialize in later. The choice for a female anti-hero may have come from serials of the time such as Feuillade’s “Fantômas” (1913) and also from the popularity of Arsène Lupin. The film ends signaling for a possible sequence that World War I prevented from happening, unfortunately.

“Filibus” prova quão complexas as narrativas cinematográficas eram apenas 20 anos depois da invenção do cinema. Nos faz imaginar como o mundo será daqui a 20 anos, com novidades como a Internet das Coisas e a Inteligência Artificial. Dito isto – esta ponte entre passado e futuro – fico muito feliz por ter tirado “Filibus” da minha lista. Já vi mais de cinco mil filmes, mas ainda há TANTO para descobrir – e sou grata por isso.

 

“Filibus” proves how complex the film narratives were a mere 20 years after cinema was invented. It makes us wonder how the world will be in 20 years, with novelties such as the Internet of Things and Artificial Intelligence. This being said – this bridge between the past and the future – I’m very happy I crossed “Filibus” out of my watchlist. I’ve watched more than five thousand movies, but there is still SO MUCH MORE to discover… and for this I am grateful.

 

“Filibus” pode ser visto no YouTube e no Internet Archive.

“Filibus” can be watched on YouTube and Internet Archive.

 

This is my contribution to the On the Spot blogathon, hosted by Rebecca at Taking Up Room.

Tuesday, November 26, 2024

As Duas Inglesas e o Amor (1971) / Two English Girls (1971)

 Estou chegando num ponto muito triste em minha vida: o ponto em que não terei mais filmes novos de François Truffaut para assistir. Com “As Duas Inglesas e o Amor” fora da lista, agora há apenas dois filmes de Truffaut que ainda não vi: “Atire no Pianista” (1960) e “A Sereia do Mississippi” (1969). Mas deixemos as lágrimas para depois. Vamos falar sobre “As Duas Inglesas e o Amor”.


I’m reaching a very sad point in my life: the point where soon I won’t have any new-to-me François Truffaut movies to watch. With “Two English Girls” off the list, now there are only two Truffaut movies I haven’t seen: “Shoot the Piano Player” (1960) and “Mississippi Mermaid” (1969). But let’s leave the tears for later. Let’s talk instead about “Two English Girls”.


Esta é uma história de amor(es).

This is a love(s) story.



Europa, virada do século XIX para o século XX. O francês Claude (Jean-Pierre Léaud) decide visitar os Brown, amigos da família. Ele já conhece Anne Brown (Kika Markham), mas não a irmã dela, Muriel. Anne apresenta Claude para Muriel (Stacey Tendeter) na esperança de que um romance floresça entre eles. Primeiro ele a deseja e não é correspondido. Depois ele a recusa quando finalmente parece que ela começou a amá-lo. O tempo passa.  


Europe, turn of the 19th to the 20th century. Frenchman Claude (Jean-Pierre Léaud) decides to visit the Browns, friends of his family. He already knows Anne Brown (Kika Markham) but not her sister Muriel. Anne introduces Claude to Muriel (Stacey Tendeter) in the hopes of a romance blossoming between them. First he wants it, and she doesn’t. Then he refuses her when she finally seems to be starting loving him. Time passes.



Em Paris, Anne se torna escultora e reencontra Claude. Eles começam um romance que evolui para um relacionamento aberto que permite que ela também durma com Diurka (Philippe Léotard). A senhora Brown (Sylvia Marriott) desaprova o que chama de “um casamento internacional”, por isso Claude e Anne continuam um relacionamento informal, até que as coisas ficam complicadas.

  

In Paris, Anne becomes a sculptor and meets Claude again. They start an affair that evolves to an open relationship that allows her to also sleep with Diurka (Philippe Léotard). Mrs Brown (Sylvia Marriott) disapproves of what she calls “an international marriage”, so Claude and Anne remain informal in their relationship, until things become more complicated.



Esta não é a primeira vez que Truffaut lidou com um trisal. Você deve se lembrar de um filme mais famoso dela, “Jules e Jim - Uma Mulher para Dois” 91962), que tem, ao contrário, uma mulher (interpretada por Jeanne Moreau) e dois homens (interpretados por Oskar Werner e Henri Serre). Curiosamente, ambas as histórias vêm da mesma mente: o romancista Henri-Pierre Roché. E todos os trabalhos citados, incluindo as primeiras colaborações de Truffaut com Jean-Pierre Léaud, versam sobre jovens apaixonados.


This isn’t the first time Truffaut dealt with a threesome. You might remember a more famous work of his, “Jules and Jim” (1962), that has instead one woman (played by Jeanne Moreau) and two men (played by Oskar Werner and Henri Serre). Curiously, both stories come from the same mind: novelist Henri-Pierre Roché. And all the films cited here, including Truffaut’s early collaborations with Jean-Pierre Léaud, verse about young people in love.



O  título original, em francês, é “Les Deux Anglaises et le Continent”: As Duas Inglesas e o Continente. É explicado logo no começo que Claude é chamado de vez em quando pelas irmãs Brown de “o continente”, porque ele vem da França, na Europa continental, e as garotas vêm de uma ilha, a Inglaterra.

The original title, in French, is “Les Deux Anglaises et le Continent”: The Two English Girls and the Continent. It is explained early on that Claude is sometimes referred to by the Brown sisters as “The Continent”, because he is from France, in continental Europe, and the girls come from an island, England.



Nestor Almendros é o diretor de fotografia. Nascido em Barcelona, Espanha, em 1930, e morto em Nova York em 1992, Almendros teve 63 créditos como diretor de fotografia e oito como diretor, a maioria deles quando era um jovem estudante de cinema, vivendo entre Roma, onde estudava, e Cuba, onde sua família estava exilada por causa da ditadura de Franco. Ele e Truffaut foram colaboradores constantes, começando em 1970 com “O Garoto Selvagem”.


Nestor Almendros is the cinematographer. Born in Barcelona, Spain, in 1930, and dying in New York in 1992, Almendros had 63 credits as a cinematographer and eight as director, most of them when he was a young film student, living between Rome, where he attended school, and Cuba, where his family was exiled from Franco’s dictatorship. He and Truffaut were constant collaborators, starting in 1970 with “The Wild Child”.



O uso da cor vermelha é notável, assim como Bergman faria em “Gritos e Sussurros”, que estreou um ano depois. Bergman justificou o uso do vermelho em seu filme como fruto de sua imaginação: ele sempre imaginou que no interior da alma haveria uma membrana vermelha. Numa biografia de Truffaut por Antoine de Baecque e Serge Toubiana, “As Duas Inglesas e o Amor” é considerado, entre os amigos do diretor, seu filme mais visualmente impactante. 


The use of the color red is notable, just like Bergman would do in “Cries and Whispers”, released one year later. Bergman justified the use of red in his movie as something coming from his own imagination: he always imagined the interior of the soul to be a red membrane. In a Truffaut biography by Antoine de Baecque and Serge Toubiana, “Two English Girls” is considered among the director’s friends the most visually beautiful film he ever made.



Este foi o primeiro filme de uma das irmãs protagonistas, Stacey Tendeter, que tinha 22 anos na época. Ela já era casada com Andrew Walton, e eles ficariam juntos até a morte dela em 2008, com apenas 59 anos. Kika Markham, por outro lado, tinha forte presença na televisão desde 1955. Ela apresentou Truffaut aos seus pais durante as filmagens, e o diretor gostou tanto deles que escalou o pai dela como vidente numa cena.


This was the film debut of one of the lead sisters, Stacey Tendeter, who was 22 at the time. She was already married to Andrew Walton, and they would remain together until her death in 2008, when she was only 59. Kika Markham, on the other hand, had a strong presence on TV since 1955. She introduced Truffaut to her parents during the shooting, and the director liked them so much that he cast his dad as the fortune teller in a scene.




Truffaut dirigiu 27 filmes numa carreira que durou menos de 25 anos. Um dia, ficarei sem filmes novos de François Truffaut. Mas sempre teremos seus filmes para rever, como alguém que visita um velho amigo - e eu aposto que ele gostaria de ser visto como um velho amigo de cinéfilos ao redor do mundo. 


Truffaut directed 27 movies in a career that lasted less than 25 years. One day, I’ll run out of new-to-me François Truffaut movies. But we’ll always have his movies to come back to, like someone who is visiting an old friend - and I bet he’d have liked to be seen as an old friend to cinephiles all over the world.

Wednesday, November 13, 2024

Resenha / Book review: La Decisión de Grace Kelly, by Sophie Benedict

 

Minha parte favorita do dia é quando posso relaxar com um bom livro. Quando a leitura é social, melhor ainda. Deixe-me explicar: chamo de “leitura social” o que faço com minha mãe. Ela está aprendendo espanhol e nós lemos juntas, para que eu possa aprimorar meus conhecimentos e ensinar a ela – que foi professora por 38 anos – algumas coisas. Já lemos contos de Gabriel García Márquez e o livro que lemos mais recentemente foi a versão em espanhol de um livro em alemão sobre Grace Kelly.

 

My favorite part of the day is when I can relax and sit back with a good book. When the reading is social, better yet. Let me explain: I call “social reading” what I do with my mom. She’s learning Spanish and we read together, so I can improve my knowledge in the language and teach her – who was herself a teacher for 38 years – a few things. We already read short stories by Gabriel García Márquez and the latest book we read was the Spanish version of a German novel about Grace Kelly.

Grace Kelly esteve sob os holofotes durante a maior parte de sua vida. Primeiro, ela foi uma das mais conhecidas atrizes da década de 1950, inclusive ganhando um Oscar numa escolha polêmica pelo filme “Amar é Sofrer” (1954). Então ela se transformou literalmente numa princesa quando se casou com Rainier de Mônaco. O casamento recebeu cobertura no mundo todo, como eu certa vez demonstrei num artigo sobre a cobertura do Casamento Real na imprensa brasileira. Mas seus dias como estudante de atuação não foram foco de nenhuma investigação mais profunda. Por isso, este período na vida de Grace poderia ser o ponto de partida para um romance especulativo.


Grace Kelly was on the spotlight for most of her life. First, she was one of the most talked about actresses of the 1950s, even winning an Oscar in a polemic choice for the film “The Country Girl” (1954). Then she became a literal princess when she got married to Rainier of Monaco. The wedding was highlighted in newspapers around the world, as I once noted in a blog post about the royal wedding in Brazilian newspapers. But her times studying to become an actress weren’t the focus of deeper investigation. Because of it, this period in her life could become the starting point for a speculative novel.

Somos apresentados a uma jovem Grace que ama brinca de atuar e se transformar em outra pessoa durante brincadeiras infantis. Quando ela tinha 17 anos, seu tio George – um vencedor do Prêmio Pulitzer – convence o pai de Grace a deixá-la ir para Nova York. Lá ela é aceita pela American Academy of Dramatic Arts, apesar de sua voz nasal. Seu professor, Sr ehlinger, inclusive reclama da voz dela na primeira aula.


We are introduced to a young Grace who loves to play theater and become someone else in her childish plays. At 17, her uncle George – a Pulitzer Prize winner – convinces Grace’s father to let her go to New York. There she is accepted to the American Academy of Dramatic Arts, despite her nasal voice. Her teacher, Mr Jehlinger, even complains about her voice in their first class.

Grace faz amizade com duas garotas que moram, como ela, no Edifício Barbizon: Mary Jo e Caitriona, ou Cai. Há uma subtrama sobre Grace ajudar Cai a fazer um aborto, mas nada muito escandaloso ou chocante – no final, não fica claro se Cai foi a um médico fazer um aborto ou teve um aborto espontâneo. Mary Jo, por outro lado, apresenta Grace ao professor Don Richardson, que se torna seu crush... e o primeiro de muitos homens mais velhos com quem ela se envolve.


Grace becomes close friends to two girls who also live at the Barbizon building: Mary Jo and Caitriona, or Cai. There is a subplot about Grace helping Cai with an abortion, but nothing too scandalous or shocking – in the end, it isn’t clear if Cai went to a doctor to perform the abortion or if she had a miscarriage. Mary Jo on the other hand introduces Grace to teacher Don Richardson, who becomes her crush… and first of many older men she dates.

Sessenta por cento do livro é gasto contando as aventuras de Grace como modelo e aspirante a atriz em Nova York. Ao chegar na marca de 60%, a narrativa é transladada para Hollywood – na verdade Grace ficou entre idas e vindas entre Hollywood e Nova York – e a parte mais conhecida da carreira dela. Lá, ela aprende muito com Hitchcock, um diretor exigente que rapidamente se entende com sua nova protagonista. Tudo o que Grace faz em Hollywood é feito com o objetivo de impressionar os pais dela, que não aprovam sua escolha de ser atriz.


Sixty percent of the book is spent telling her adventures as a model and aspiring actress in New York. Hitting the 60% mark brings the narrative to Hollywood – actually Grace went back and forth between Hollywood and New York – and the best known part of her career. There, she learns a lot with Hitchcock, an exigent director who quickly clicks with his new leading lady. Everything she does in Hollywood is done with the goal to impress her parents, who disapprove of her career choice.

Em muitas ocasiões um personagem aconselha Grace a desistir de seu sonho de ser atriz e encontrar um marido que a sustente. E em muitas ocasiões Grace declara que quer ser independente e não depender de nenhum homem. Seu sonho é se casar com um homem que ela realmente ame. E ela tem muitos relacionamentos baseados não em amor verdadeiro, só em atração física.


In many occasions a character advises Grace to stop pursuing her dream of becoming an actress and find a husband who can support her. Time and again Grace says she wants to be independent and not rely on any man. Her dream is to get married to a man she genuinely loves. And she has many relationships based not on true love, just physical attraction.

Surpresa, surpresa: a autora imagina um encontro entre Grace Kelly e Marilyn Monroe, então chamada Norma Jean e trabalhando como modelo em Nova York. Norma dá à jovem Grace conselhos sobre atuação e aceitar ofertas – ela diz que é preciso saber quando dizer “não”, mas mostra que falar é fácil, o difícil é seguir seu próprio conselho. Outro encontro é com Marlon Brando, que é retratado como um desagradável mascador de chicletes no escritório de Edith van Cleve. Edith foi uma agente teatral real para jovens atores iniciantes. Brando, um desconhecido como Grace, se incomoda quando tem de esperar Edith atender Grace antes dele.


Surprise, surprise: the author imagines an encounter between Grace Kelly and Marilyn Monroe, then called Norma Jean and working as a model in New York. Norma gives the younger Grace advice about acting and accepting offers – she says it’s necessary to know when to say “no”, but shows that this is easier said than done. Another encounter is with Marlon Brando, who comes across as a gum-chewing unpleasant brat at Edith van Cleve’s office. Edith was a real theatrical agent for young and upcoming actors. Brando, an unknown like Grace, is bothered that he has to wait for Edith to see Kelly before his appointment.

O título original em alemão é “Grace und die Anmut der Liebe”, que pode ser traduzido como “Grace e a Graça do Amor”. Foi escrito por Sophie Benedict, pseudônimo da autora alemã Steffi von Wolff de Frankfurt. Grace Kelly é sua atriz favorita e a autora escolheu prestar uma homenagem a ela através deste livro – mas teve resultados ambíguos, na minha opinião.


The original title is “Grace und die Anmut der Liebe”, that can be translated as “Grace and the Grace of Love”. It was written by Sophie Benedict, the pseudonym of German author Steffi von Wolff from Frankfurt. Grace Kelly is her favorite actress and the author chose to pay a tribute to her through this book – but it achieved mixed results, in my opinion.

Se eu fosse um membro da família de Grace, não ficaria satisfeita com a maneira como é retratada no livro. Grace é apresentada como frívola e obcecada, tendo casos com todos os homens mais velhos com quem travalha. Sim, ela até é retratada como alguém que faz tudo com perfeição, o que pode agradar aos seus fãs, que são o público-alvo do livro. Minha mãe quase desistiu da leitura, mas nós chegamos ao fim a tempo de celebrar o que seria o 95º aniversário de Grace. Feliz aniversário, doce princesa – você ainda é amada e lembrada.


If I was a member of Grace’s family, I wouldn’t be happy with her portrayal in the novel. Grace is presented as frivolous and obsessed, having affairs with all older men she gets to work with. Yes, she is portrayed as someone who does everything perfectly, and this may please her fans, who are the target for the book. My mother almost gave up on reading, but we reached the end in time to celebrate what would be Grace’s 95th birthday. Happy birthday, sweet princess – you are still loved and remembered.

 

This is my contribution to The 6th Wonderful Grace Kelly blogathon, hosted by The Wonderful World of Cinema and The Flapper Dame.

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