} Crítica Retrô: August 2019

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Saturday, August 31, 2019

A Sétima Cruz (1944) / The Seventh Cross (1944)


ESTA CRÍTICA TEM SPOILERS

THIS ARTICLE HAS SPOILERS

A guerra mais violenta, degradante e mortal de todas começou em 1939, mas os horrores já estavam acontecendo há anos na terra de Hitler. Os nazistas chegaram ao poder na Alemanha em 1932, quando se tornaram o partido majoritário do Reichstag - o Congresso alemão. No ano seguinte, 1933, o primeiro campo de concentração foi aberto. Dachau serviu como local para enviar presos políticos antes de os judeus serem escolhidos como principal alvo do ódio nazista. Mesmo que campos de concentração já existissem desde o século XIX - quando colonizadores europeus construíram campos na África para eliminar a população local - estes lugares de extermínio são comumente associados à Segunda Guerra Mundial.

The most violent, degrading and mortal war of them all started in 1939, but the horrors were already happening for years in Hitler’s land. The Nazis came to power in Germany in 1932, when they became the largest party in the Reichstag - the German Congress. The following year, 1933, the first concentration camp opened. Dachau served as a place to keep political prisoners before Jews were chosen as the main target for the Nazis’ hate. Even though concentration camps existed since the nineteenth century - when European colonizers built those camps in Africa to kill the locals - these places for extermination are often associated with World War II.


“A Sétima Cruz” é a história de sete prisioneiros que, em 1936, fogem do campo de concentração fictício de Westhofen. Entre eles está George Heisler (Spencer Tracy), que quer reencontrar sua amada Leni (Kaaren Verne). No campo, o comandante ordena que os outros prisioneiros ergam sete cruzes, nas quais ele pretende crucificado cada fugitivo - depois de torturá-los, obviamente.

“The Seventh Cross” is the story of seven prisoners who, in 1936, escape from the fictional concentration camp of Westhofen. Among them there is George Heisler (Spencer Tracy), who wants to be reunited with his beloved girl, Leni (Kaaren Verne). Back at the camp, the commander orders the other prisoners to build seven crosses, where he intends to crucify each fugitive - after torturing them, of course.


Enquanto isso, na cidade vizinha de Mainz, um amigo de George está preocupado com ele. Franz Marnet (Herbert Rudley) procura pelo líder da Resistência na cidade, e juntos eles conseguem passaportes falsos para George - o único problema é que George acredita que Franz está em Berlim, e Franz não faz ideia de onde George pode estar escondido.

Meanwhile, in the neighboring city of Mainz, a friend of George’s is worried about him. Franz Marnet (Herbert Rudley) looks for the leader of the Resistance in town, and together they get fake passports to give George - the only problem is that George believes Franz is in Berlin, and Franz has no idea where George could be hiding.


George encontra Leni em Mainz - a mesma Leni que prometeu esperar por ele para sempre agora está casada e ameaça contar para seu marido que ela viu o fugitivo. George não pode confiar em mais ninguém. Ele começa, assim como Blanche Dubois, a depender da bondade de estranhos - primeiro uma costureira (Agnes Moorehead) que é amiga de outro fugitivo, depois um médico judeu que cuida de um ferimento de George e decide não entregá-lo às autoridades. Sim, há oprimidos contribuindo com os opressores, mas ainda pode haver algumas pessoas decentes entre os oprimidos, que sabem o tanto que sofrem e que não desejam o mesmo destino para ninguém.

George finds Leni in Mainz - the same Leni who promised to wait for him forever is now married and threatens to tell her husband that she saw the fugitive. George can’t trust anybody anymore. He starts, like Blanche DuBois, depending on the kindness of strangers - first a dressmaker (Agnes Moorehead) who is friends with another fugitive, then a Jewish doctor who treats George’s wound and decides not to report him to authorities. Yes, there are oppressed people siding with the oppressors, but there may still be a few decent ones among the oppressed, who know what they’ve been through and won’t want the same fate to anybody.


Membros histéricos da Juventude Hitlerista tomam uma vila e invadem casas em busca de um fugitivo. Para algumas pessoas, ver um homem ser caçado por nazistas é como ver um evento esportivo. O povo comemora e um homem faz piada quando o fugitivo - que felizmente não é George - é preso. Numa realidade nazista, as melhores pessoas são os indiferentes: pelo menos eles não contribuem para a desgraça de ninguém.

Hysterical members of the Hitler Youth go through the village and invade houses looking for a fugitive. Watching a man being hunted by Nazis is like watching a sports event for these people. The people cheer and a man makes a joke when the fugitive - luckily, not our George - is arrested. In a Nazi reality, the best people are the indifferent ones: at least they don’t contribute to someone’s misery.


George tem de procurar por Rudolf Schenck no número 46 da Morgenstrasse em Mainz. Quando ele chega ao endereço, uma vizinha o informa, com um sorriso debochado, que Rudolf e a esposa haviam sido presos pela Gestapo. Essa vizinha certamente informará à Gestapo sobre George - não há pessoas piores que as que são como esta vizinha, incapazes de cuidar somente de suas próprias vidas e que se enchem de prazer ao destruir os outros.

George has to look for Rudolf Schenck at 46 Morgenstrasse in Mainz. When he arrives at the address, a neighbor informs him, with a mocked smile, that Rudolf and his wife had been arrested by the Gestapo. This neighbor will certainly talk to the Gestapo about seeing George - there are no people worse than this neighbor kind, who can’t mind only their own business and feel pleasure in destroying others.


George, perturbado, procura pelo velho amigo Paul Roeder (Hume Cronyn) e sua esposa Liesel (Jessica Tandy). Paul é um cidadão comum: ele está feliz que seu salário aumentou e obedece ao Führer quando ele ordena que as famílias alemãs - só as famílias arianas, obviamente- tenham mais filhos. Ele está preocupado com os fins, não com os meios. E daí que o país está produzindo muito armamento e as minorias estão sendo sistematicamente eliminadas? A vida dele melhorou, e isso é tudo que parece importar para ele. Felizmente, Paul aceita ajudar o velho amigo - e eu posso estar sendo pessimista, mas não vejo essas pessoas que preferem os fins aos meios ajudando os outros.

A disturbed George then looks for his old friend Paul Roeder (Hume Cronyn) and his wife Liesel (Jessica Tandy). Paul is a common citizen: he is happy that his wage increased and obeys the Führer when he says German families - only the Arian ones, obviously - must make babies. He’s worried about the ends, not the means. So what that the country is producing a lot of guns and minorities are being systematically erased? His life got better, and that’s all that seems to matter to him. Fortunately, Paul agrees to help his old friend - I may be a pessimist now, but I don’t see those ends-over-means people helping anyone.


Outro amigo de George, Bruno Sauer (George Macready), em um primeiro momento se mostra demasiado covarde para ajudar, mas então se redime. Assim como muitos outros, Bruno tem uma vida confortável - seu banheiro cheio de espelhos é quase labiríntico- e aceita a situação porque ele tem medo de arriscar tudo para fazer a coisa certa. George mais uma vez terá de depender de estranhos, como o operário Fiedler (Paul Guilfoyle), o padeiro Poldi Schlamm (Felix Bressart) e a garçonete Toni (Signe Hasso).

Another friend of George’s, Bruno Sauer (George Macready), is at first too coward to help, but then redeems himself. Like many people, Bruno lives a comfortable life - his bathroom full of mirrors is almost a labyrinth- and compromises with the situation because he’s afraid to risk everything to do something right. George once again will have to rely on strangers, like factory work Fiedler (Paul Guilfoyle), baker Poldi Schlamm (Felix Bressart) and waitress Toni (Signe Hasso).


Mesmo que a saga de George se pareça com um suspense, ficamos enojados e alarmado com a história: afinal, é real, muitas pessoas passaram por dificuldades inenarráveis depois de fugirem de um campo de concentração, não é uma história inventada de detetive. E o mais terrível disso tudo é que você fica tão acostumado com o mal que não consegue mais confiar em ninguém- eu não conseguia confiar em nenhum personagem assim que ele aparecia, e por causa dessa desconfiança a situação de George fica mais difícil.

As much as George’s saga looks like a thriller, we are more disgusted and alarmed by the story: after all, it’s real, some people have been through hell after escaping a concentration camp, it is not an invented detective story. And the most awful thing in this whole tale is that you get so used with seeing evil that you start trusting nobody - I couldn’t trust any character at first, and because of these mistrust issues George’s situation gets harder.


A principal característica de um campo de concentração é que ele não é uma prisão: as pessoas não precisam ser condenadas por um crime para serem presas em um - elas apenas precisam ser consideradas perigosas ou repulsivas por aqueles que detêm o poder para serem mandadas para um campo de concentração. Eu não quero parecer demasiado dramática ou alarmista, mas todas essas coisas não foram deixadas em um passado sombrio - elas estão acontecendo novamente, agora. Imigrantes estão sendo separados de suas famílias em campos na fronteira dos EUA. As pessoas estão comemorando a desgraça alheia. Empatia está se tornando algo raro - porque quem não é alvo de discurso de ódio não consegue se colocar no lugar de pessoas que são, e por isso nada é feito contra o discurso de ódio. A esperança é cada dia mais difícil de ser mantida - mas “A Sétima Cruz” nos mostra que uma centelha de esperança é suficiente para iniciar a mudança. Ou, como escreveu uma menina naquela época:

“É difícil em tempos como estes: ideais, sonhos e esperanças permanecerem dentro de nós, sendo esmagados pela dura realidade. É um milagre eu não ter abandonado todos os meus ideais, eles parecem tão absurdos e impraticáveis. No entanto, eu me apego a eles, porque eu ainda acredito, apesar de tudo, que as pessoas são realmente boas de coração”. 
Anne Frank


The main characteristic of a concentration camp is that it’s not a prison: people don’t have to be found guilty of something to be imprisoned there - they just need to be found as dangerous or repulsive by those in power in order to be sent to a concentration camp. I don’t want to sound overly dramatic or alarmist, but all those things weren’t left in a somber past - they are happening again, now. Immigrants are being separated from their families in camps at the US border. People are cheering at someone’s disgrace. Empathy is becoming rare - because people who are not target of hate speech can’t put themselves in the places of people who are, therefore they do nothing against the hate speech. Hope is harder and harder to maintain - but “The Seventh Cross” shows us that one spark of hope is enough to start change. Or, as a girl wrote back then:

“It's difficult in times like these: ideals, dreams and cherished hopes rise within us, only to be crushed by grim reality. It's a wonder I haven't abandoned all my ideals, they seem so absurd and impractical. Yet I cling to them because I still believe, in spite of everything, that people are truly good at heart.” 
 Anne Frank
This is my contribution to the World War II blogathon, hosted by Maddy and Jay at Maddy Loves Her Classic Films and Cinema Essentials.


Monday, August 26, 2019

Announcing the Luso World Cinema Blogathon


According to the Babbel website, 260 million people in the world speak Portuguese – about 220 million are native speakers. This makes Portuguese the sixth most spoken language in the world! Nine countries have Portuguese as their official language: Portugal, Brazil, Angola, Mozambique, Cape Verde, Guinea-Bissau, East Timor, Equatorial Guinea and São Tomé e Príncipe.


But why am I talking about that? Well, the language you all find when you reach this blog, in the title and in the non-italic text, is Portuguese. For five years, this blog was in Portuguese only, and since in 2016 it is a bilingual blog. The blog’s slogan is “classic film with a tropical twist”, and this is what I try to do: bring a Portuguese-speaking perspective to my analysis.

Carmen Miranda, born in Portugal, raised in Brazil

That’s why I got extremely excited when Beth Gallagher from the blog Spellbound by Movies talked about the Luso World Cinema Blogathon she was planning – because countries that speak Portuguese are called “Lusophone”. Cinema in Portuguese is rich and often unexplored by non-Portuguese speakers – and it should be discovered by everybody!

"City of God", 2002

The first films arrived in both Portugal and Brazil in 1896, and since the first decade of the 20th century these countries were making movies. So far, one film spoken in Portuguese has won the Oscar for Best Foreign Language Film (1959's "Black Orpheus", and the award went to its French producers), and the Brazilian movie “The Given Word” (“O Pagador de Promessas”, 1962) won the Palme D’Or at Cannes.

Director Anselmo Duarte (shaking his hand with someone else)
arrives at Santos with the Palme D'Or

All the Portuguese-speaking countries, except Brazil and Portugal, were still colonies until the middle of the 20th century – this means that their national cinema developed in a different rhythm and circumstances. Furthermore, both Brazil and Portugal went through dictatorships in the past century, and it impacted the Lusophone cinema with censorship, shifts of subject and, of course, the organization of a resistance cinema.

Brazilian filmmaker Alberto Cavalcanti

The main filmmakers in Brazilian cinema are Mário Peixoto – who only directed the 1930 masterpiece “Limite” – Humberto Mauro, Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos and Eduardo Coutinho, all of them already deceased. Right now, there are many new voices appearing in Brazilian cinema – but they are at risk since the new government supports censorship.

Humberto Mauro

In Portugal, the main filmmaker was without a doubt Manoel de Oliveira, who in 1942 was using techniques that the Italian Neorrealism would only begin to use six years later. Manoel de Oliveira lived to be 106!
Manoel de Oliveira

Not only Luso films made an impact in the film world, but also many people from Portuguese-speaking countries or descendants of Portuguese-speaking people work in film. For instance: classic Hollywood actress Mary Astor was of Portuguese ancestry from her mother’s side – in fact, her real name was Lucile Vasconcellos Langhake. Actor Daniel Brühl’s father was born in Brazil from German parents. Nowadays, in Hollywood, we have actors Rodrigo Santoro and Alice Braga, directors Carlos Saldanha and Fernando Meirelles, producer Rodrigo Teixeira (all born in Brazil), actress Camila Mendes (daughter of a Brazilian couple) and many more that will surprise you.

Mary Astor

So, for this blogathon, you can choose any film from a Lusophone country and also people born in Lusophone countries or people with Lusophone ancestry. And you can even talk about a song in Portuguese, like “Brazil”, a famous song by Ary Barroso that was featured in several movies.


The blogathon runs November 12th until November 15th. Pick a topic, grab a banner, and “vamos lá!” (“let’s go!”)

Here are some resources that may help you:

List of films from São Tomé and Príncipe: :(

The contributors:

Maddy Loves Her Classic Films - Tribute to Lena Horne
Pale Writer - Keanu Reeves in "Point Break" (1991)
Poppity Talks Classic Film - "The House of Sand" (2005)
Strictly Vintage Hollywood - Helena D'Algy and Tony D'Algy - film "A Sainted Devil" (1924)
Ana Roland - Sonia Braga
Wide Screen World - "Francisca" (1981)
A Shroud of Thoughts - "Aniki Bobó" (1942)
Realweegiemidget Reviews - Rue McClanahan in "They Might be Giants" (1971)
The Midnite Drive-In - "The Eyes of my Mother" (2016)
Voiceover - "Ossos" (1997)
Silver Screenings - Tribute to Carmen Miranda 
Movies, Silently - "Braza Dromida" (1928)
Musings of a Classic Film Addict - Carmen Miranda in "Down Argentine Way" (1941)
Pop Culture Reverie - "Central Station" (1999)
Crimson Kimono - "Gayjin - A Brazilian Odyssey" Part I (1980) and Part II (1985)
Moon in Gemini - "Dona Flor and her Two Husbands" (1976) 
Cinema Parrot Disco - "City of God" (2002)
In the Good Old Days of Classic Hollywood - Favorite Mary Astor films
Taking Up Room - "The Miracle of Our Lady of Fatima" (1952) 
Silentology - Louise Fazenda in "A Bear Affair" (1915)
MovieRob - Tom Hanks in "Inferno" (2016), Keanu Reeves in "The Devil's Advocate" (1998), Mary Astor in "Across the Pacific" (1942) and Joe DeRita in "Three Stooges in Orbit" (1962)

The banners:
















Sunday, August 25, 2019

Renúncia ao Ódio (1956) / The Bottom of the Bottle (1956)


“Renúncia ao Ódio” se passa em um rancho, mas não é exatamente um faroeste. O filme também trata de uma fuga da prisão, mas não é um filme sobre prisioneiros. E ele tem tons noir, mas não é completamente noir. Felizmente, “Renúncia ao Ódio” é difícil de definir, mas fácil de gostar.

“The Bottom of the Bottle” is set on a ranch, but it's not exactly a western. The film is also about escaping from prison, but it's not a prison movie. And it has noir overtones, but it's not fully noir. Luckily, “The Bottom of the Bottle” is hard to define, but easy to enjoy.


Numa noite, Pat ‘P.M.’ Martin (Joseph Cotten) cruza a fronteira com o México. Quando ele volta, uma tempestade está caindo, o rio próximo à casa dele transbordou e ele tem um convidado inesperado em casa: seu irmão mais novo Donald Martin (Van Johnson), que acabou de fugir da prisão e quer que Pat o ajude a cruzar a fronteira.

One night, Pat 'P.M.' Martin (Joseph Cotten) crosses the border to Mexico. When he comes back, it's raining a lot, the river near his house has overflowed and he has an unexpected guest at home: his younger brother Donald Martin (Van Johnson), who has just escaped from prison and wants Pat to drive him past the border.


A esposa de Pat, Nora (Ruth Roman), nunca ouviu falar de Donald, por isso Pat o apresenta como Eric Bell, um velho amigo que ele encontrou por acaso. Além de ter problemas com a lei, Donald / Eric também tem problemas com o álcool, e para completar o cenário caótico ele não pode atravessar a fronteira por causa do rio que transbordou.

Pat's wife, Nora (Ruth Roman), has never heard of Donald, so Pat introduces him as Eric Bell, an old friend he ran into. Besides having a problem with the law, Donald / Eric also has a drinking problem, and to complete the chaotic scenario he can't cross the border because of the overflowed river.


Todos têm pelo menos um problema neste filme: Nora tem um casamento problemático com Pat, Pat mente para esconder a verdadeira identidade de Donald dos seus amigos ricos, e Donald não pode sucumbir à tentação e voltar a beber. Já se passou mais de uma década desde “Farrapo Humano” (1945), e agora o cinema trata o alcoolismo como assunto sério. Com tantos problemas, você pode esperar alguns confrontos homéricos.

Everybody has at least an issue in this movie: Nora has a troubled marriage with Pat, Pat lies to hide Donald’s real identity to his wealthy friends, and Donald must not succumb to temptation and start drinking again. It’s been more than a decade since “The Lost Weekend” (1945), and now cinema treats alcoholism as a serious subject. With so many issues, you can expect a few Homeric confrontations.


A performance de Van Johnson é muito boa, em especial em algumas cenas: quando ele recebe uma ligação na casa de Lil e começa a ficar nervoso, atraindo a atenção de todos; e quando ele conversa com sua esposa e filhos pelo telefone, à beira das lágrimas. Na verdade, esta é a melhor atuação de Van Johnson que eu vi até agora.

Van Johnson's performance is very good, in special in a few particular scenes: when he receives a call at Lil's house and starts becoming nervous, attracting everyone's attention, and when he talks to his wife and children on the phone, on the verge of tears. In fact, this is the best performance by Van Johnson I have seen so far.


Joseph Cotten podia fazer qualquer papel, de herói a vilão perturbador – como em “A Sombra de uma Dúvida” (1943), de Hitchcock. Aqui ele é um herói perturbado que precisa fazer as pazes com seu irmão e com seu passado. Van Johnson tem o papel mais desafiador, e Cotten faz bem o seu papel. E ele e Johnson de fato parecem ser irmãos!

Joseph Cotten had a huge acting range, from hero to chilling villain – like in Hitchcock's “Shadow of a Doubt” (1943). Here he is a troubled hero who has to make peace with his brother and with his past. Van Johnson has the meatier role, and Cotten does the best with what he's given. And he and Johnson sure look like brothers!


Ruth Roman está muito bem como uma mulher vivendo um casamento em crise permanente. Pat se preocupa mais com sua reputação do que com sua esposa, e não quer aquilo que ela mais deseja: filhos. O papel mais famoso de Ruth Roman foi Anne em “Pacto Sinistro” (1951), e ela também é conhecida por ter sido sobrevivente do naufrágio do SS Andrea Doria.

Ruth Roman is very well as a woman in a marriage going through a permanent crisis. Pat worries more about his reputation than about his wife, and he doesn't want what she longs for the most: children. Ruth Roman’s most famous role was Anne in “Strangers on a Train” (1951), and she is also known for being a survivor at the sinking of the SS Andrea Doria.


“Renúncia ao Ódio” é baseado em um romance autobiográfico de Georges Simenon. Simenon era como Pat: ele viveu em Nogales, Arizona, próximo à fronteira com o México e estava bem de vida, enquanto seu irmão Christian se metia em problemas. Até hoje, foram feitas mais de 170 adaptações da obra de Simenon para a TV e o cinema, a maioria delas filmada na França – sendo “Renúncia ao Ódio”, obviamente, uma exceção.

“The Bottom of the Bottle” is based on an autobiographical novel by Georges Simenon. Simenon was like Pat: he lived in Nogales, Arizona, by the Mexican border and was doing well in life, while his brother Christian got in trouble. So far, there are over 170 film and TV adaptations of Simenon’s work, most of them made in his homeland, France – being “The Bottom of the Bottle”, of course, an exception.
 
Georges Simenon
Henry Hathaway é um diretor que não recebe o crédito que merece. Ele trabalhou como ator apenas uma vez, em 1917, e em 1919 começou a trabalhar com objetos de cena. Ele se tornou diretor assistente em 1924 e diretor em 1930. Ele dirigiu muitos faroestes de sucesso e também “Torrentes de Paixão” (1953), um filme que, assim como “Renúncia ao Ódio”, também é protagonizado por Joseph Cotten, tem elementos noir e envolve uma sequência-chave em um rio.

Henry Hathaway is a director that is not as praised as he should be. He worked as an actor only once, in 1917, and in 1919 started working with props. He graduated to assistant director in 1924 and to director in 1930. He directed many successful westerns and also “Niagara” (1953), a film that, like “The Bottom of the Bottle”, stars Joseph Cotten, has noir elements and involves a key sequence in a river.


Com apenas 85 minutos, “Renúncia ao Ódio” não foi, infelizmente, um sucesso de bilheteria. Ele tem, entretanto, o melhor de muitos mundos e traz seus protagonistas na melhor forma. Para uma distração rápida e emocionante, “Renúncia ao Ódio” é uma boa ideia – a ser consumida sem moderação.

With only 85 minutes, “The Bottom of the Bottle” wasn’t, unfortunately, a box-office hit. It has, however, the best of many worlds and it presents its leads at their best. For a quick and thrilling entertainment, “The Bottom of the Bottle” is a good idea – to not be consumed moderately.

This is my contribution to the Third Van Johnson Blogathon, hosted by Michaela at Love Letters to Old Hollywood.

Saturday, August 24, 2019

Visões de Criança (1925) / Faces of Children (1925) / Visages D'Enfants (1925)


Esta é uma das mais velhas histórias do mundo: a do filho que sente ciúmes quando o pai viúvo decide se casar novamente. É mais do que ciúme: é o sentimento de que a memória da falecida mãe está sendo traída e esquecida. Uma história triste porém comum, e que se torna poética quando um cineasta francês decide fazer um filme sobre isso – afinal, os franceses fizeram alguns dos filmes mais tocantes e delicados.

It's one of the oldest stories in the world: the child that feels jealous when his father, a widower, decides to remarry. It's more than jealousy: it's the feeling that the dead mother's memory is being betrayed and forgotten. A sad yet common story that becomes poetic once a French filmmaker decides to make a film out of it – after all, French people have made some of the most touching and delicate films.


Pierre Amsler (Victor Vina) acaba de perder a esposa (Suzy Vernon). A morte da mãe afetou profundamente o filho mais velho, Jean (Jean Forest), enquanto a filha mais nova, Pierrette (Pierrette Hoyeuz), parece não entender o que aconteceu. Na primavera seguinte, Pierre decide se casar com Jeanne Dutois (Rachel Devirys), uma viúva que tem uma filha, Arlette (Arlette Peyran).

Pierre Amsler (Victor Vina) has just lost his wife (Suzy Vernon). The mother's death deeply affects their older son, Jean (Jean Forest), while their younger daughter, Pierrette (Pierrette Hoyeuz), seem to not understand what happened. The following spring, Pierre decides to marry Jeanne Dutois (Rachel Devirys), a widow who has a daughter, Arlette (Arlette Peyran).


Pierre pede Jeanne em casamento justamente num domingo, quando ele deveria visitar o túmulo de sua esposa. Apenas Jean visita o túmulo e leva flores, e este é o primeiro sinal de que Pierre pode já estar esquecendo e substituindo sua esposa. Incapaz de contar a novidade e Jean, Pierre pede ajuda ao Padre Porchet (Henri Duval). O Padre já havia ajudado Jean quando o menino teve um colapso nervoso logo após a morte da mãe.

Pierre proposes to Jeanne exactly on a Sunday, when he's supposed to visit his wife's tomb. Only Jean visits the tomb and brings flowers, and this is the first sign that Pierre may have already forgotten and replaced his wife. Unable to tell Jean the news, Pierre asks Father Porchet (Henri Duval) for help. The Father had helped Jean when the boy had a nervous breakdown right after his mother's death.


Jean passa algumas semanas com o Padre Porchet. Enquanto isso, Pierre e Jeanne se casam. Jean aceita a nova realidade com relutância, mas as coisas já começam mal quando Arlette não deixa Jean entrar na própria casa porque ela não sabia que ele estava voltando – e pior: ela está usando os lápis de cor dele!

Jean spends a few weeks with Father Porchet. Meanwhile, Pierre and Jeanne get married. Jean reluctantly accepts his new reality, but things are off to a bad start when Arlette doesn't let Jean enter his own house because she wasn't aware of his return – and worse: she is using his crayons!


A casa dele está mudada, sua rotina é diferente, e de repente Jean percebe que sua madrasta está usando as coisas da mãe dele. Na verdade, ele prefere destruir o velho vestido da mãe a ver Jeanne reutilizando o tecido. Mas Jeanne é uma boa madrasta: ela cuida de Jean e Pierrette e até proíbe Pierre de bater em Jean. É Arlette quem Jean mais odeia – por isso ele bola um plano para que ela leve uma bronca da mãe... mas ela acaba presa em uma avalanche.

His house is changed, his routine is different, and suddenly Jean realizes his stepmother is wearing his mother's things. In fact, he prefers to destroy his mother's old dress than to see Jeanne reusing its fabric. But Jeanne is a good stepmother: she cares for Jean and Pierrette and even prohibits Pierre to spank Jean. Arlette is the one Jean hates the most – so he makes up a plan to get in trouble with her mother... but she ends up trapped in an avalanche.


O jovem Jean Forest é simplesmente brilhante. Desde a primeira cena, em que ele parece realmente emocionado durante o funeral da mãe, é possível ver o quão talentoso o menino de 12 anos era. Infelizmente, Jean fez filmes de 1923 – quando foi descoberto pelo diretor Jacques Feyder – até 1935, quando ele decidiu focar em sua carreira no rádio.

Young Jean Forest is simply brilliant. Since the first scene, in which he seems truly moved during his mother's funeral, you can see how talented the 12 year-old boy was. Unfortunately, Jean Forest worked in film only from 1923 – when he was discovered by director Jacques Feyder – until 1935, when he decided to focus on radio work instead.


As duas garotas tiveram carreiras ainda mais curtas. A incrível Arlette Peyran não fez mais nenhum filme, e Pierrette Hoyeuz se aposentou das telas em 1926. Todos os atores mirins de “Visões de Criança” são ótimos, e sabemos que filmes sobre crianças podem facilmente se tornar chatos ou entediantes se as crianças não souberem atuar.

The two girls had even shorter careers. The amazing Arlette Peyran never did another film, while Pierrette Hoyeuz retired from the screen in 1926. All the child actors are remarkable in “Faces of Children”, and we know how films about children can easily become obnoxious or boring if the kids can't act.


Além de capturar belas imagens, o diretor Jacques Feyder editou “Visões de Criança” com maestria – quase como Eisenstein faria. A edição rápida em muitas cenas evoca muitas emoções na plateia e aumenta a carga dramática conforme vemos dois personagens convergindo para o mesmo ponto em um momento muito tenso.

Besides capturing gorgeous images, director Jacques Feyder edited “Faces of Children” like a pro – almost like Eisenstein would do. The quick cross-cutting in many scenes evokes many emotions in the audience and enhances drama as we see two characters converging to the same point in a very tense moment.


O filme adiciona muito melodrama e alguns efeitos especiais no clímax – uma sequência semelhante ao clímax de “Inocente Pecadora” (1920), mas melhor em alguns momentos. A paisagem natural – os Alpes – é de tirar o fôlego, e a maneira como ela é usada, quase como mais um personagem, é uma das marcas registradas de Feyder.

The film adds a lot of melodrama and some special effects in the climax – a sequence somewhat similar to the climax of “Way Down East” (1920), but better in some moments. The natural landscape – the Alps – is breathtaking, and the way it is used, almost as another character, is one of Feyder's trademarks.


Em 1923, Jacques Feyder escreveu um artigo para a revista austríaca “Der Internationale Film” dizendo que filmes de sucesso têm dois componentes: “uma história simples, um evento que fala com todas as inteligências, com todos os corações e a história deve ser situada em um cenário característico, ao mesmo tempo pitoresco e natural; em uma palavra ela deve criar, com o maior entendimento artístico, uma ‘atmosfera’”. Esta parágrafo não define apenas o cinema de Feyder, mas também “Visões de Criança”, sua obra-prima.

In 1923, Jacques Feyder wrote an article for the Austrian magazine “Der Internationale Film” saying that successful films had two components: “a simple story, an event that speaks to all intelligences, to all hearts and the story should be situated in a characteristic setting, at the same time picturesque and natural; in one word it should create, with the greatest artistic understanding, an 'atmosphere'”. This paragraph doesn't only define Feyder's cinema, but also “Faces of Children”, his masterpiece.

This is my contribution to the Vive la France! blogathon, hosted by Patty and Christian at Lady Eve’s Reel Life and Silver Screen Modes.

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